Sociedade

Best Shopping dará lugar a
pelo menos 500 apartamentos

DANIEL LIMA - 18/11/2015

O número que consta do título deste artigo não é definitivo, mas é a base do estrondo. Tudo pode acontecer num projeto imobiliário, mas é certa a projeção de que teremos um verdadeiro estupro urbanístico nas imediações da Chácara Inglesa, em São Bernardo. O palco principal são os 8,2 mil metros quadrados que sediaram o Best Shopping, demolido depois de quase uma década de abandono. O caos viário se tornará ainda mais exasperante. Os efeitos irradiadores irão se manifestar muito além daquele espaço territorial.


 


Pelo menos 500 novos apartamentos serão construídos em duas torres de 25 andares naquele bairro de classe média que, se antes temia e reclamava dos riscos de um imóvel em estado de deterioração, vai sofrer um bocado com um afluxo de veículos monstruoso. Seriam perto de dois mil moradores e 900 veículos adicionais. Se o fator construtivo for o máximo previsto pela nova legislação, ou seja, oito vezes em relação ao terreno e não cinco, serão 640 apartamentos.


 


Quem se utiliza do sistema viário no entorno da Chácara Inglesa, colada à Via Anchieta, sabe que o agravamento da situação será mais um teste à paciência e novo desfalque no bolso de cada um. Mais tempo no trânsito significa mais desperdício de dinheiro.


 


Daí sempre ter alertado neste espaço que urbanistas cometem barbeiragens quando esquecem de ponderar que não são apenas os veículos os vilões dos engarrafamentos. A verticalização imobiliária sem comedimento é insumo básico dessa disfuncionalidade.


 


Responsabilidade da Prefeitura


 


A gestão de Luiz Marinho é responsável pela hecatombe que acertaria em cheio a Chácara Inglesa e imediações. Mais uma aliás. Ao liberar dois milhões de metros quadrados de São Bernardo à farra do boi do mercado imobiliário, o petista azeita as engrenagens do comprometimento ainda maior da competividade econômica da região. Logística não é brincadeira de criança.


 


A gestão Luiz Marinho flexibilizou demais os critérios de construção. No caso do Best Shopping, o fator multiplicador pode chegar a oito vezes o tamanho do terreno. Imagine quanto lucrou a empresa que adquiriu aquele terreno quando a legislação não permitia nem duas vezes o potencial de construção?


 


Há muita nebulosidade a cercar o arremate do que sobrou do Best Shopping. Havia intrincadíssimo modelo de partilhamento de proprietários daquele espaço comercial. Tanto era confusa aquela engrenagem societária que especialistas em corretagem de imóveis quebraram a cara durante anos a fio para tentar encontrar o caminho das pedras da conciliação. Mais de uma centena de participantes do condomínio empresarial falavam línguas diferentes durante o período em que o Best Shopping funcionou aos trancos e barrancos e também depois, quando foi desativado e entregue literalmente às baratas, aos ratos e a muitos outros elementos estranhos à origem do negócio.


 


Solução fantástica


 


Tudo no Best Shopping estava embaralhadíssimo até que a Administração Luiz Marinho entrou em campo com dedicação extraordinária. Tão extraordinária que surgiram e se mantêm especulações sobre até que ponto estava em jogo apenas o interesse público de botar abaixo aquele prédio que se transformou em desagradável cartão postal de São Bernardo, nas proximidades do Km 18 da Anchieta.


 


Há muitas questões a serem respondidas. Por isso enviei a vários servidores públicos de São Bernardo, inclusive ao prefeito Luiz Marinho e ao procurador-geral do Município, série de perguntas sobre o que se passa e o que se passou com aquela área. Também o secretário de Desenvolvimento Urbano, Alfredo Buso, recebeu cópia do material.


 


O Poder Público tem obrigação de responder a tudo que é de interesse da sociedade. A venda do terreno do Best Shopping talvez não fosse motivo de ação jornalística além do que já foi, ou seja, do processo que culminou com a demolição daquele monstrengo abandonado.


 


Entretanto, quando na sequência aprova-se como aprovou nova legislação sobre uso e ocupação do solo que beneficia tremendamente os compradores do imóvel, em detrimento da qualidade de vida em forma de mobilidade urbana, o mínimo que se espera de um gestor social é que seja transparente nas informações.


 


Uma das perguntas à Administração Luiz Marinho é sobre a identidade do novo proprietário da área. Quero apenas confirmar o nome com as informações que detenho. Pode parecer irrelevante, mas, diante de tudo que se comenta sobre o negócio, pode ser o começo de um capítulo especial.


 


Além dos limites


 


Certo mesmo é que o feliz proprietário gozará de ganho extraordinário quando a tempestade da recessão passar e o empreendimento imobiliário for lançado. A área consta da geografia do uso de venda de autorizações de construções além dos limites do Plano Diretor, decorrente da negociação de Cepacs (Certificados de Potencial Adicional de Construção),negociados diretamente na Bolsa de Valores. São as chamadas outorgas onerosas. Na verdade, outorgas generosas.


 


A mudança de uso e ocupação do solo com base na Operação Urbana Consorciada foi aprovada em julho último por um Legislativo que não debateu o assunto, porque controlado pelo Executivo, e um Clube dos Especuladores Imobiliários omisso no repasse de informações privilegiadas. A sociedade foi esquecida. Como se nada valesse o destino de vasta área do território de São Bernardo, ameaçada de entrar em colapso num futuro não tão distante assim. O incentivo a elevação do potencial construtivo foi incrementado na esteira da anunciada chegada da Linha Bronze do monotrilho. Uma obra de financiamento complicado do governo estadual e do governo federal nestes tempos de dureza generalizada.


 


Outorgas onerosas, segundo o modelo brasileiro de favorecer os grandes players imobiliários, são uma tremenda roubada ao multiplicarem extraordinariamente os lucros em detrimento da qualidade de vida em forma de mobilidade urbana.


 


Outorgas generosas


 


Num texto que publiquei nesta revista digital em janeiro de 2014, com base em dados brutos do jornal Estadão, mostrei que até então as outorgas onerosas permitiram a construção de 5,3 milhões de metros quadrados excedentes, que geraram recursos de R$ 1,7 bilhão à Capital de São Paulo. Escrevi na sequência:


 


 O Estadão enxergou algumas árvores, mas deixou escapar a floresta de irregularidades que o mecanismo de compensação alimenta na Capital e também na Província do Grande ABC. (...) A conta é simples para mostrar o quanto o mercado imobiliário beneficia-se da legislação que criou a outorga onerosa em 2002 na cidade de São Paulo. Os números divulgados (...) indicam que foram adicionados no congestionadíssimo território da Capital do Estado nada menos que 5,3 milhões de metros quadrados em 10 anos. São o equivalente a 66.250 apartamentos de 80 metros quadrados, o que representaria uma cidade de 200 mil habitantes (...). Seriam nada menos que 828 torres de 20 metros quadrados a impactar o território paulistano. (...) As construtoras e incorporadoras pagaram à Prefeitura de São Paulo a contrapartida financeira de R$ 1,7 bilhão pela elasticidade das construções. (...) Uma merreca perto dos estimados (e subestimados) R$ 432,400 bilhões de Valor Geral de Vendas obtidos pelos empresários do setor imobiliário. (...) Cada metro quadrado liberado adicionalmente pela Prefeitura em forma de outorga generosa custou aos empresários do setor, em média, R$ 320,75. Um valor mais que irrisório, quase desprezível, porque em forma de metro quadrado construído como imóveis verticais e horizontais se transformou em pelo menos R$ 8 mil.


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