Quando algum desventurado pretender resumir minha vida profissional, vai precisar tomar muito cuidado para não cair do cavalo da imprecisão informativa. Sei lá se algum dia alguém vai se meter na maior enrascada da vida, que é tentar sintetizar o que andei fazendo por aqui. Há coisas mais importantes a preparar. Se alguém escrever que fui o maior festeiro da Província estará reproduzindo uma verdade. Mas é uma verdade que comporta outra verdade bastante superior: um festeiro que não tinha a menor paixão por festas. Dá para entender algo assim?
Comandei por 15 anos seguidos o Prêmio Desempenho, lançado em 1994 quando dirigia a revista LivreMercado. O Prêmio Desempenho foi o que de mais revolucionário já existiu no gênero no País. Contemplava gente e entidades públicas e privadas. Das áreas social, econômica, cultural, esportiva, de tudo que se imaginava. Contava com Conselho Deliberativo que decidia os vencedores da temporada. Chegamos a reunir 260 conselheiros. Quase uma turma que decide o Oscar. A sociedade estava engajada. Havia auditoria externa em todas as planilhas, além de os próprios conselheiros conferirem as respectivas notas que atribuíram.
Seria cabotinice dizer que o Prêmio Desempenho só existiu durante 15 dos 18 anos em que controlei editorialmente a revista LivreMercado porque eu seria um cara porreta? Bobagem. Para realizar aqueles eventos que contavam com duas edições anuais e ao longo do tempo acolheu mais de 80 mil convidados, era preciso contar com duas qualidades: trabalhar intensamente em equipe sem abrir mão da centralização de decisões e não se deixar seduzir pela tentação. Tanto uma condição quanto outra jamais faltaram. Quem conhece minha história sabe disso. Prêmios encomendados jamais fizeram parte do histórico daquele evento.
Larguei recentemente o Diário do Grande ABC porque não havia perspectiva de os planos serem executados. Deixei sangrar a proposta de criar o movimento Defenda Grande ABC porque a maioria dos participantes não tinha o perfil necessário à empreitada, por razões já explicadas, a maioria das quais respeito. Quando há controle sobre as decisões a serem tomadas, não fujo da luta. Muito pelo contrário.
Passado explica presente
Poderia elencar outras ações das quais participei ao longo da vida como prova de que me entrego completamente ao coletivismo e sou intransigente contra os individualistas. Desde que as amarras não sejam tantas a tornar a empreitada besteiragem. O perfil de agregador que alguns idiotas juramentados tentam me negar se revelou desde cedo. Fui um atirador exemplar ao servir ao Exército. Requisitaram-me como orador da turma num Paço Municipal de Santo André friorento, tendo ao lado o então prefeito Newton Brandão. Antes disso, nos tempos infantis escolares, participava de todos os movimentos cívicos como um dos cabeças de chave.
Muito mais poderia escrever mesmo correndo o risco de ser mal-interpretado. O maior elogio que já recebi como profissional frequenta minha memória há muito tempo. A alguém que se apresentou como candidato a uma vaga foi solicitado um breve currículo. Ao dizer que tinha atuado em minha equipe, o interlocutor foi curto e grosso: se trabalhou mesmo com ele durante todo esse tempo, você está aprovado. Sou tão rigoroso no trabalho como um cara alegre e afável fora das quatro linhas do gramado.
Sei que um idiota ou outro vai dizer que estou perdendo a humildade. Antes supostamente perdê-la do que deixar sem resposta abutres que não fazem outra coisa senão construir mentiras que incautos acabam por acreditar porque incautos geralmente são estúpidos disfarçados de omissos.
Inviolabilidade ética
Tenho muito orgulho dos 15 anos do Prêmio Desempenho. Entregamos 1.718 troféus, sempre com critérios meritocráticos previamente definidos e aprovados. Jamais houve cambalacho na premiação, como é comum nesse tipo de evento. Chegamos a tal ponto de isenção que uma empresa multinacional ser patrocinadora e outra, do mesmo ramo, sagrar-se uma das Melhores do Ano. Estou me referindo à Bridgestone e à Pirelli. Não houve mal-estar. Aliás, o resultado ajudou a construir a inviolabilidade ética da premiação.
Mas, afinal de contas, por que estou a escrever sobre o Prêmio Desempenho? Porque estou devendo faz tempo a inserção nesta revista digital de boa parte do acervo de LivreMercado sobre o evento. Vamos recuperá-lo sim e enxertá-lo nestas páginas.
A maior premiação regional do País não pode ficar para a história apenas no formado impresso. Vai ganhar o mundo digital para que todos compreendam a importância daquele evento. Sim, aquele evento não era apenas a peça mais importante do calendário regional. Era a transposição para o palco da linha editorial de LivreMercado, sempre voltada à valorização de cases empresariais e sociais e também à ovação de gente que ajudou a construir a Província do Grande ABC. Por essa gente, não seríamos Província.
Não faltam interlocutores que me abordam sobre o Prêmio Desempenho. Vivo experiências fascinantes, mas me sinto paradoxalmente constrangido. Jamais fui um festeiro de verdade. O Prêmio Desempenho era a licença poética de minha vida profissional. Entretanto, ser lembrado pelo Prêmio Desempenho, como se a revista LivreMercado não fosse a marca editorial mais incisivamente comprometida com o futuro da região, muitas vezes me causa dissabor.
Os elogios ganham forma de alienação. A revista sempre foi mais importante para o conjunto da obra que ajudamos a construir. O Prêmio Desempenho era uma ação deliberadamente preparada para massificar os conceitos revolucionários da linha editorial de LivreMercado.
Antídoto aos bandidos
O suposto festeiro mais importante da história regional – alguém tem dúvidas sobre isso, depois de 1.718 troféus entregues em 15 anos? – jamais passou de um jornalista que prefere mil vezes a discrição de um encontro em ponto não identificado com fontes preciosas a me abastecer com informações sigilosas que ajudam a destruir mitos de prevaricadores protegidos pela mídia em geral. Um desses mitos, até outro dia autopropagandista de benemerências sociais, não passa de bandido social.
Embora recuse a essência do rótulo de maior festeiro da região, porque pode transmitir a sensação de que tenha sido um deslumbrado com a própria profissão, não posso deixar de encarar a realidade histórica: ninguém se empenhou tanto para levar tanta gente ao palco em forma de homenagem.
Graças a tudo isso conseguimos eleger dezenas de Madres Terezas e de Freis Galvões, lideranças sociais que cuidam dos desvalidos de uma sociedade tremendamente injusta entre outras razões porque o Estado é uma abstração que toma grande parte da riqueza nacional e conta com o respaldo de supostas inteligências de esquerda, as quais não passam de embusteiros, e de espertíssimos representantes da direita, que não passam de gatunos.
Por isso, por denunciar os bandoleiros e não dar colher de chá aos falsos protetores do povo, sou obrigado a trabalhar em regime de autoexílio para ouvir quem deve ser ouvido e transmitir informações preciosas em nome de quem não pode enfrentar as quadrilhas organizadas que saqueiam o futuro da sociedade regional – como se isso fosse problemático, depois de assassinarem o passado e usurparem do presente.
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21/01/2025 PAULINHO, PAULINHO, ESQUEÇA ESSE LIVRO!