A lista de políticos que constam de planilhas da Odebrecht Infraestrutura, resultado da 23ª etapa da Operação Lava Jato, representa apenas o começo do começo do ingresso mesmo que tangencial da força-tarefa do Ministério Público Federal, da Polícia Federal e do juiz Sérgio Moro no território regional. Vem muito mais chumbo grosso. Quando botarem lupas para valer na região, a situação ficaria muito mais complicada para os beneficiários do esquema que transformou a maior empresa do País em paraíso de propinas.
Já em setembro de 2014 – portanto, há quase dois anos – escrevi neste espaço, sob o título “Tubarões da Petrobras na região querem ser peixinhos do delator”, a respeito do potencial de esgarçamento do tecido de marginalidade política da região. Ainda continuamos a ser peixes pequenos no conjunto da obra.
O recente protagonismo de Lula da Silva não vale nessa contabilidade de passivos da região. O ex-presidente está sendo objeto de investigações por supostas irregularidades sem relação direta com gestores públicos locais. A Lava Jato ainda não chegou diretamente na região. Chegar diretamente significa unir dinheiro desviado em associação com obras físicas mutretadas. Há indícios de que não faltariam nem uma coisa nem outra.
Nada que envolva a Província na Lava Jato será surpreendente para quem conhece a estrutura de financiamento eleitoral e o apetite por mobilidade social de mandachuvas e mandachuvinhas. Sem dinheiro farto dificilmente se ganha eleição no País. E sem desvios de caixa das campanhas eleitorais, candidatos e parceiros não seriam tão devotados.
As grandes corporações que consolidaram generosidades eleitorais não são candidatas a sugerir ao Papa Francisco que se crie apêndice à canonização de pessoas jurídicas no organograma da Igreja Católica. Os dirigentes dessas organizações não têm essa veleidade. Prefeririam, como sempre obtiveram, a obscuridade muitas vezes bem remunerada do anonimato compensador.
Voltando ao passado
Escrevi em setembro de 2014: “Há um bocado de gente na Província do Grande ABC preocupadíssima com os desdobramentos de novo escândalo da cadeia de malfeitos na Petrobras. O ex-executivo da estatal, Paulo Roberto Costa, está colocando fogo no paiol de irregularidades da maior empresa brasileira. Não devem faltar rescaldos locais. O Polo Petroquímico de Capuava, com forte influência da estatal, acionista de peso da Braskem, é o centro de atenções na região. Historicamente aquelas empresas sempre deram uma mão aos políticos e candidatos a políticos da coalização de partidos no comando federal. Não seria diferente em mais de uma década de PT”.
A Odebrecht é sócia majoritária da Braskem, empresa-mãe do Polo Petroquímico da Província. A Braskem faz parte do conglomerado da Odebrecht que aparece na distribuição de dinheiro mais que provavelmente sujo descoberto nos imóveis de Benedicto Barbosa Silva Júnior, presidente afastado da Odebrecht Infraestrutura. Quando me refiro ao Polo Petroquímico incluo também o braço ambiental da Odebrecht em Mauá, a Foz do Brasil, empresa que, segundo revelações da força-tarefa, abarcou parte importante da distribuição de dinheiro nas últimas campanhas eleitorais sem a correspondente regularidade de financiamento oficial.
Uma ninharia até agora
Não vou repetir aqui detalhadamente informações que constam dos principais jornais do País sobre a dinheirama endereçada a mais de 300 políticos. O foco regional é prioridade. A lista de beneficiários com endereço político na região mal chega a uma dezena. Vai se multiplicar na medida em que executivos da Odebrecht tiverem pedido de delação premiada aceito pela força-tarefa. Os cabeças municipais das operações poderão entregar parceiros de jornada ainda não mencionados. Os pouco mais de R$ 5 milhões repassados em circunstâncias mais que suspeitas são quase nada perto do montante que lubrificou a máquina eleitoral na região na última década.
O dinheiro anda tão curto na região, como efeito da Operação Lava Jato, que não faltam restaurantes a lamentar a quebra de fluxo de clientes graduados na política. Eles deram no pé. Locais disputadíssimos e locais discretos sentem os efeitos da retração da clientela. Bases aliadas de prefeitos locais já não são tão aliadas assim.
Mensalinhos que sustentavam maiorias explícitas ou dissimuladas sofrem duros reveses. Já não se tem dinheiro com a fartura de antes. Aliás, já não se tem dinheiro. Se fidelidades legislativas ainda se sustentam, credite-se ao estoque de empregos de comissionados. Eles fazem parte das negociações de alienação de decisões nada republicanas.
Minha Casa, Minha Fortuna
Se a força-tarefa da Lava Jato aprofundar-se um pouco mais nas investigações, e se quiser tomar a região como campo experimental à prospecção de outra área, os escândalos vão pipocar. Uma investigadazinha no lote de construção do projeto Minha Casa Minha Vida infernizaria a vida de mercadores imobiliários que se aproximaram de tentáculos do governo federal com espírito público da boca para fora e voracidade econômica do bolso para dentro.
Como Lava Jato está muito ligada à Petrobras, talvez fosse interessante constituir novo grupo de investigações que fizesse de Minha Casa Minha Vida algo especificamente esclarecedor. Sei que o Ministério Público Federal, a Polícia Federal e o Judiciário mal dão conta da avalanche de irregularidades já detectadas. Talvez não se tenha infraestrutura pessoal e material para nova frente de batalha. Quando houver, os alicerces dos mercadores imobiliários vão tremer. Eles se multiplicam nas sombras do Poder Público corrompido.
Quando lancei a proposta de criação do Defenda Grande ABC, o fiz tendo como premissa provocar a institucionalidade em frangalhos da região e também como prova de fogo para conhecer de perto quem realmente teria tutano para enfrentamentos indigestos. Sobraram poucos depois de muitas reuniões.
Sociedade amedrontada
A sociedade regional está amedrontada porque a força de pressão de mandachuvas e mandachuvinhas que se sentem intocáveis vem de um passado já distante. A Operação Lava Jato pode resgatar a autoestima regional em paralelo às investigações em curso, retirando-se da lista de suspeitos quem realmente não tem nada a ver com falcatruas e incluindo muitos nomes que estão a faltar, até porque outros delatores e outras provas ainda estão em fase de análises.
A Província do Grande ABC precisa sair da escuridão institucional que a abate e que a transforma em paraíso dos bandidos sociais, vários dos quais travestidos de generosos investidores sociais.
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21/01/2025 PAULINHO, PAULINHO, ESQUEÇA ESSE LIVRO!