Imprensa

Veja como encontrei o Diário que
Ronan Pinto comprou em 2004 (6)

DANIEL LIMA - 30/08/2018

Prosseguimos com um trabalho inédito que desenvolvi no Diário do Grande ABC. Antes de assumir a direção de Redação daquele jornal em 21 de julho de 2004, munido de um Planejamento Editorial Estratégico de 95 mil caracteres, atuei como o primeiro e único ombudsman daquela publicação. E utilizei uma ferramenta de comunicação que preservou aqueles tempos. Os insumos do OmbudsmanDiário foram encontrados recentemente no meu acervo digital. Chegamos hoje ao quinto capítulo do material encaminhado a diretores, acionistas e editores do Diário do Grande ABC. O que pode ser lido na sequência foi produzido em 18 de junho de 2004. É indispensável acompanhar esta série. O Diário do Grande ABC reformista ficou pelo caminho.  

Edição número cinco

Continuamos a recuperar um dos períodos inusitados dos atuais 60 anos de atuação do Diário do Grande ABC. Esta série trata especificamente do pouco mais de um mês em que atuei como primeiro ombudsman (e único) daquela publicação, entre junho e julho de 2004. O empresário Ronan Maria Pinto acabara de se tornar acionista majoritário da publicação e me contratara para mudar os rumos editoriais. Apresentei o que chamei de Planejamento Editorial Estratégico, farol que municiava meus trabalhos. A edição de 17 de junho tratava de vários temas, entre os quais a histórica classificação do Santo André à decisão da Copa do Brasil contra o Flamengo. Vale a pena ver como funcionava o jornal naquele período e o que este jornalista propunha de mudanças pontuais e estruturais. 

A função que desempenho me torna escravo de questionamentos. Pergunto-me muitas vezes se devo neste espaço atuar mais como representante dos leitores, dos diretores e acionistas ou dos jornalistas. Enquanto não encontro a resposta possivelmente mais sensata, vou-me equilibrando nesses três vértices. Admito que corro riscos porque, no fundo, no fundo, a condição de leitor pode sobrepor-se às demais. Se isso de fato ocorrer, creio que, no fundo, no fundo, todos ganharão, porque não deve existir quem não se veja mesmo como consumidor de informação, por mais que esteja envolvido diretamente no processo de empreendedorismo e de produção editorial, ou seja, como diretores e acionistas e como profissionais de comunicação. 

 Primeira página

Exceto a foto em tamanho reduzido do presidente da BM&F sobreposta ao flagrante do Big Ben da Vila de Paranapiacaba, a primeira página do jornal desta sexta-feira espelha o conteúdo interno. O flagrante de Paranapiacaba poderia mesmo ser mais amplo, sem o penduricalho do dirigente financeiro. 

 Lei Seca

O jornal volta ao temário "Lei Seca" com discretíssima matéria de uma coluna de Setecidades. Sob o título "Sindicato dos bares estuda estratégia contra lei seca", destaca-se posicionamento nada conclusivo da presidente do Sehal e se coloca no complemento o que deveria ser o texto que justificaria um outro título, ao apanhar a declaração do comandante do 6º Batalhão da Polícia Militar. O coronel Márcio Mateus é enfático no apoio à Lei Seca em São Caetano, ao contrário do que o Sehal tem defendido até agora, e fundamenta a colocação ao citar o que antecipamos aqui e que constam dos dados do Instituto de Estudos Metropolitanos: roubos e furtos de veículos e roubos e furtos diversos são uma tempestade na vida do morador local.  

Talvez se o Sehal for acossado, pode saltar uma matéria que justifique o título e muito mais que uma coluna.  

 Metropolização (I)

A cobertura de um dos painéis da Urbis, na Capital, em matéria sob o título "Municípios devem agir contra criminalidade, concluem autoridades", mostra que o jornal não está morto no agendamento desse que é o evento mais importante para a vida metropolitana. A matéria secundária sobre os artesãos, inclusive com bela foto de primeira página, acrescenta a certeza de que o jornal correu atrás de uma cobertura em princípio vacilante. De maneira geral, tanto o Estadão quanto a Folha também estão dando ao evento importância aquém da necessidade. Contamos com pouquíssimos profissionais na mídia que enxergam o caos metropolitano além da fratura exposta de temários campeões de audiência sem compromisso com reformas. 

 Metropolização (II)

Li ontem à noite, depois da copidescagem da Malu Marcoccia, os textos de Vera Guazzelli e André Marcel de Lima, que acompanharam os painéis mais importantes da Urbis. Metade das metas traçadas já foi concluída pelos dois jornalistas. O material exprime o longo histórico da revista LivreMercado no tratamento de questões intimamente ligadas à geografia do Grande ABC e que invadem territórios próximos. É muito provável que os dois trabalhos -- e outros que serão entregues provavelmente hoje -- componham a próxima Reportagem de Capa da revista. O jornal poderia ter associado a cobertura pontual da criminalidade com abordagem mais aprofundada de outros temários. 

 Santo André na final

Eleva-se a temperatura para a decisão da Copa do Brasil e o Santo André ganha cada vez mais destaque nas páginas do jornal. Li outro dia repercussão interessante dos jornais de Porto Alegre após a vitória do Santo André sobre o 15 de novembro de Campo Bom. Não seria igualmente oportuno retratar a cada dia o que os jornais cariocas estão publicando sobre essa decisão histórica? 

 Santo André derrotado

Acho que caberia uma matéria de viés estatístico que mostrasse o que separa o Santo André do céu classificatório e o Santo André do inferno do rebaixamento na Série B do Campeonato Brasileiro, depois do julgamento de ontem no Rio. Fiz na newsletter Capital Social Online de hoje uma incursão a respeito. 

 Paranapiacaba

Perdemos para o Estadão hoje, que deu cobertura mais qualificada à Vila de Paranapiacaba. Fomos burocráticos demais. A importância dessa histórica vila para a sensibilização do turismo de negócios na região mereceria cobertura mais destacada em termos gráfico e textual. 

 Caminhos ferroviários

Sob o título "MRS conclui laudos prévios de esteira sobre sistema funicular", Economia produz matéria de interesse singular para o setor de infraestrutura econômica. Por isso mesmo os aspectos econômicos poderiam ser muito melhor explorados. Até que ponto o sistema a ser implantado será bom negócio para o Grande ABC e não apenas para a MRS Logística, concessionária dos trens de carga da ferrovia Santos/Jundiaí? Já escrevi na newsletter Capital Social Online sobre alguns eventuais mitos que estariam se solidificando na esteira do Ferroanel e do Rodoanel que passarão pela geografia regional.

 Caminhos viários

Complicadíssimo esse jogo de liberação de recursos do BID (Banco Interamericano de Desenvolvimento) para a rediagramação viária de São Bernardo (e parte de Santo André e Diadema). O jornal publica nova matéria hoje sob o título "S. Bernardo e BID encerram hoje reunião". O início das obras está atrasadíssimo -- o que contraria frontalmente as previsões iniciais, que podem ser resgatadas no banco de dados. O cronograma de novas reuniões, que consta da matéria, poderia ensejar uma abordagem específica sobre esse labirintesco processo decisório.

 Dica de texto (I)

O Informediário está mais dinâmico, mas precisa de cuidados com o acabamento editorial. Escrever "mês de junho" é incorreto, embora não seja uma marca apenas dessa editoria. Tratar cerimoniosamente os protagonistas da coluna também não fica bem. "Na ocasião, o doutor Haroldo Arcuri passará a nova gestão para a doutora Heloísa Ferreira da Costa" como consta da nota "Transição" não corresponde à linguagem jornalística. 

 Dica de texto (II)

Recorrer à expressão "de acordo com" quando não se trata de informação que possa representar risco de definição da fonte é descartável. Há vários casos diariamente no jornal que poderiam ser varridos para que os textos tenham arejamento e qualificação. Um exemplo, da matéria "Centro vai reciclar professores da rede", está na seguinte frase: "De acordo com ele, atualmente 5% dos professores da rede ainda não tem formação superior". No contexto em que foi preparada a matéria, a implicitude do autor da informação dispensaria aquela expressão. E assim tem sido em muitos casos. Voltaremos ao assunto. 

 Quem é Gilson Menezes?

Está certo que Gilson Menezes é conhecido ex-prefeito de Diadema, mas a matéria à página 2 do caderno Política Grande ABC sob o título "Bloco rompe aliança com Gilson Menezes e decide futuro hoje" não faz qualquer menção ao fato de ser ele uma terceira força importantíssima no jogo eleitoral de Diadema. A matéria poderia ter recorrido à última pesquisa do jornal para situar o leitor sobre a relevância do candidato. A isso chamo de contextualização. O jornal tem o péssimo hábito, em linhas gerais, de recorrer apenas episodicamente ao banco de dados. 

 Transporte gratuito

A notícia "S. Bernardo tem R$ 3,5 mi para subsidiar passe livre" está tecnicamente correta, mas faltou interpretação. Um adendo que se fazia necessário, sem maiores incursões, seria algo como ("a menos de cinco meses das eleições municipais"), "a Câmara Municipal aprovou ontem por unanimidade, em sessão extraordinária, um artigo substituto que autoriza a abertura de crédito especial no valor de até R$ 3,5 milhões, na Secretaria de Finanças, para ser utilizado até o fim deste ano como reembolso às empresas de transporte. Antes, o mesmo artigo dizia apenas que o repasse seria feito à conta de dotações orçamentárias próprias" -- escreveu o jornalista. 

O festival de gratuidade no transporte público de São Bernardo foi exposto sem qualquer contraposição do autor da matéria, embora não haja dúvidas, em meu entender, de que se trata também de medida estranhamente sincronizada com o calendário eleitoral. Será que todos os vereadores de oposição aprovaram a medida que beneficia aposentados, idosos, pensionistas e deficientes? Ou será que se retiraram do plenário? Considerando-se que a própria matéria afirma que "até dois meses atrás só tinham direito ao benefício idosos maiores de 60 anos e aposentados ou pensionistas maiores de 55 anos com renda igual ou inferior a R$ 480", como resistir à possibilidade eleitoral se agora estão isentos de pagar passagens em ônibus todos os aposentados, pensionistas e maiores de 65 anos; os maiores de 60 anos residentes na cidade; portadores de deficiência (com laudo prévio); policiais militares, guardas municipais, atiradores do Tiro de Guerra e funcionários dos Correios desde que fardados e em serviços; e crianças de até cinco anos", conforme detalha o texto? 

O texto auxiliar (retranca) que trata da questão nos outros municípios incorre em falha de abordagem comum no jornalismo atual: as informações não são sistematizadas para facilitar o entendimento dos leitores. Traduzindo: falta um lide (abertura) mais denso, mais compactador do que na sequência e, com isso, gera-se dispersão informativa. 

 Compatibilização

A sobreposição da logomarca "Cultura & Lazer" geralmente adotada nas ilustrações da página de capa do caderno nem sempre apresenta o visual gráfico compatibilizador apresentado na edição de hoje. Há edições em que uma confusão de cores assemelhadas prevalece. Como leitor, não gosto da mistura da identificação da página com a ilustração da reportagem. Entre outros motivos também porque os demais cadernos não seguem esse princípio. 

 Legenda não é texto

Não fosse a legenda da matéria "Golpe de Estado reencontra público fiel no Grande ABC", no Cultura & Lazer, os leitores não saberiam que a banda é paulistana. Jamais a legenda deve servir de muleta para buracos editoriais. Pelo contrário: legenda é ferramental para complementar o título. 

 Hora dos professores

Bom o texto, apesar da ressalva já exposta, e ótimas as fotos da matéria que abre Setecidades sob o título "Centro vai reciclar professores da rede". 

 Padrão gráfico

Recebi de Irati Ribeiro Motta o seguinte texto:

"Concordo com você, Daniel. O projeto gráfico do jornal deve ser mantido, sem invenções. Temos um padrão para os intertítulos, que deve ser seguido. Infelizmente, só vi a página depois de impressa. Ontem tinha um paginador de folga, pois trabalhou no final de semana (Edson Vara); estou com um paginador de férias (Renato Osawa); o Anderson teve um problema pessoal e atrasou para chegar e o Éder está só 50% (está trabalhando com o dedinho da mão direita quebrado). O Magão também estava de folga e na folga do Magão, fico na fotografia também, até o JB chegar. Logo, foi um dia atípico. Entrei às 10 da manhã, fechei o caderno de Turismo, coordenei as pautas e cuidei da infografia até às 18 horas, quando subi, atrasada, para a reunião de pauta, para riscar a capa. Realmente, não deu pra ver o caderno de Cultura, mas já falei com o paginador, pois para mudar o projeto gráfico eu tenho que ser consultada. Obrigada".



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