Sociedade

Médico recomenda que procurar
hospital logo é melhor remédio

DANIEL LIMA - 15/04/2020

O que os leitores vão ler na sequência é uma reportagem censurada pelo Estadão. Censurada é o termo mais apropriado, embora o autor afirme que o texto foi recusado. Questão de semântica. E de diplomacia também.

O resumo geral é que há uma informação bombástica que a chamada Grande Mídia jamais divulgou e pelo andar da carruagem de interesses obscuros nem divulgará. Uma informação que conflita duramente com as recomendações massivamente levadas ao público. Inclusive pelo ministro da Saúde, Luiz Henrique Mandetta.

Quem afirma o que se segue é o renomado médico Roberto Kalil: “Procure o hospital ao primeiro sinal da doença. Não espere os sintomas se agravarem. Isso pode ser a diferença entre a vida e a morte”.

Essa declaração e muito mais estão na reportagem assinada pelo jornalista Fernão Lara Mesquita, ramificação da família Mesquita, fundadora do jornal Estadão. Trabalhei para os Mesquitas como freelance e depois como contratado durante muitos anos. Fernão Mesquita assina o blog “Vespeiro”, para onde remeteu os leitores de sua coluna no Estadão a fim de que consumissem a matéria proibida.

Acompanhem os cuidados com que Fernão Lara Mesquita preparou a reportagem que o Estadão negou-se a publicar. Sob o título “Muito além da cloroquina”, o jornalista deixa nas entrelinhas da discrição uma mensagem que exige reflexão. Por que, afinal, retarda-se tanto a necessidade de correr para um hospital ao primeiro sinal do novo Coronavírus? A resposta está no texto proibido na Grande Imprensa. 

Muito além da cloroquina

Alexandre Fernandes, 44 anos, empresário de Joinville, esportista, não fumante, sem nenhuma “co-morbidade”, era um dos membros da comitiva de Jair Bolsonaro na fatídica viagem a Mar-A-Lago, o resort de Donald Trump em Palm Beach, Florida, no começo de março de que quase todos os participantes menos os presidentes brasileiro e americano voltaram contaminados pelo coronavírus.

Fernandes desembarcou no Brasil dia 11 de março, uma 4a feira, sentindo um certo excesso de cansaço, dor no corpo e um pouco de febre. Na 5a ligou para seu médico, o imunologista dr. Roberto Zeballos, passou no consultório em São Paulo e colheu material. Sábado já tinha o resultado: positivo para coronavirus.

Domingo começou a falta de ar. Fernandes baixou ao hospital Vila Nova Star para a primeira tomografia. O pulmão estava cheio de manchas. 20% comprometido. A saturação de oxigênio baixara a 85 quando o normal é em torno de 98. Além do cateter injetando 1 litro de oxigênio por minuto nas narinas, passou a ser tratado com remédios para baixar a febre e antibióticos para prevenir infecções oportunistas.

Segunda-Feira já não tinha forças para comer nem podia passar sem o cateter de oxigênio na dose de 2 litros por minuto. Na 3a já não tinha forças para ir até o banheiro sozinho. Na 4a passou a 4 litros de oxigênio por minuto. Na 5a o PCR, um indicador de imunologia que marca inflamação a partir do grau 4, chegara a 14 e o jovem saudabilíssimo de apenas seis dias antes não conseguia erguer o celular para … despedir-se da família. “Senti minha vida indo embora”… 

Fez a segunda tomo e a imagem que surgiu era sinistra. 80% do pulmão estava afetado. Foi para a UTI com os médicos discutindo a iminente entubação, momento a partir do qual a medicina praticamente se rende e tudo fica nas mãos de deus. Mas ele escreve reto por linhas tortas.

Antes da decisão final o dr. Zeballos recorre ao dr. Marcelo Amato, pesquisador de renome internacional e um dos maiores pneumologistas do Brasil. Vários médicos consultados pelo Vespeiro reputam-no como “um cientista”. A sorte estava a favor de Alexandre. Amato acabara de ler um estudo do Hospital Jinyntan, de Wuhan, relatando 201 casos de pacientes com nível crítico de pneumonia relacionada ao coronavirus tratados com um novo esquema publicada apenas três dias antes no Journal of the American Medical Association . O que se relata ali é um tratamento controvertido que envolve uma espécie de “escolha de Sofia” da medicina. Mas o estado de Alexandre era crítico, a esposa dele também é médica e a proposta, embora contra-intuitiva, ia na direção de suspeitas compartilhadas por imunologistas com experiência no tratamento de quadros pulmonares semelhantes aos do coronavírus. E, agora, tinha o endosso de um dos maiores especialistas do Brasil. Todos os ingredientes necessários para uma decisão de risco como aquela estavam reunidos.

Nas primeiras medições da sexta-feira o quadro tinha parado de piorar. No sábado o PCR retornara a 12 e iniciou-se a redução da quantidade de oxigênio injetado via cateter. No domingo o PCR tinha voltado a 8. Na 3a o cateter de oxigênio já não era mais necessário. Na 4a, 25, Fernandes fez a terceira tomografia e nem os médicos acreditaram no que viram. “Parece que você fez um transplante escondido. Seu pulmão está cristalino“. A quinta e a sexta seguintes ainda foram passadas no hospital para seguir com os antibióticos intravenosos até o fim da série de segurança, proceder o “desmame” dos esteróides e esperar o resultado do ultimo teste de coronavírus. Negativo! Na sexta à noite, 27/3, Fernandes estava em casa festejando com a família.

Como funciona esse tratamento

Os tratamentos com antivirais cuidam de retardar a multiplicação dos vírus de modo a dar tempo aos organismos infectados para vencê-los com o seu próprio sistema imunológico. No fundo trata-se de uma corrida. O sistema imunológico leva um tempo para entender o inimigo com que está lidando mas, se esse inimigo não destruir a pessoa antes pelos danos colaterais que vai produzindo nos seus órgãos vitais, o mais provável é que acabará por decifrá-lo e liquida-o.

É isso que explica porque 85% das pessoas que contraem o coronavírus, ou não chegam a ter sintoma algum, ou conseguem eliminá-lo depois de passarem por desconfortos não maiores que os de uma gripe. Essa porcentagem é a daqueles cujos sistemas imunológicos venceram o vírus “no 1º round”. Só em 15% dos infectados o vírus provocará danos suficientes para produzir sintomas mais pesados. E destes apenas 5% evoluirão para o “2º round” onde os sintomas se agravam a ponto de requerer hospitalização e implicar risco de morte.

O que acontece com essa minoria?

Um pulmão vai à breca ou por infecção bacteriana, ou por inflamação. Ou pela combinação das duas coisas. Os problemas com o coronavírus são dois. A facilidade com que se espalha e, principalmente, a velocidade vertiginosa com que se multiplica dentro dos organismos contaminados. Por razões ainda desconhecidas o sistema imunológico de alguns indivíduos, diante da invasão, desencadeia uma reação “exagerada”. São as chamadas “tempestades de citoquinas” nos pulmões onde passa a acumular-se um tal excesso de umidade e matérias orgânicas que, mesmo antes que qualquer infecção oportunista por bactérias chegue a instalar-se, os alvéolos, bloqueados, não conseguem mais perfazer a função de tirar oxigênio do ar e injetá-lo no sangue.

Nas pessoas idosas, que convivem com cargas mais pesadas de bactérias em seus organismos, o pulmão é o primeiro órgão atacado diante de qualquer fator de aumento de vulnerabilidade. O mesmo acontece com as chamadas “co-morbidades” ou doenças anteriores. Nos pacientes enfraquecidos pelo ataque do vírus essas doenças prévias agravam-se até matá-lo. Daí o tratamento padrão consistir em cobrir o paciente com antibióticos para estimular seu aparelho imunológico contra as bactérias e com injeção forçada de oxigênio – por cateter nasal, primeiro; por respiração mecânica, no extremo – para evitar que uma pneumonia o mate antes que seu sistema imunológico possa eliminar as bactérias ou vírus atacantes.

O uso de esteróides ou corticoides para reduzir processos inflamatórios é evitado nesses casos porque o que essas drogas fazem é, exatamente, baixar o funcionamento do sistema imunológico, aquele que combate as infecções bacterianas e, eventualmente, as outras doenças anteriores do portador do coronavírus. Ou seja, para reduzir a inflamação arrisca-se agravar as infecções.

O princípio que apoia o uso da hidroxicloroquina no tratamento de coronavírus é o mesmo que justifica o ataque com esteróides. Embora essas substancias sejam muito diferentes uma da outra as duas têm efeito antiinflamatório. Só que a cloroquina é muito menos potente que os esteróides e tem um séquito de possíveis efeitos colaterais muito maior. Pode ajudar, portanto, apenas se aplicada muito no início do tratamento, mas com os riscos todos desses efeitos colaterais, alguns dos quais podem ser graves. 

O ataque com esteróides (metilprednisolona) combinado com claritomicina funcionou mesmo num caso extremo como o de Alexandre Fernandes, o primeiro a ser tratado com esse protocolo no Brasil (ha uma indisfarçável guerra de vaidades de médicos em torno desse pioneirismo). Depois dele já tirou outros nove pacientes tratados pela dupla Zeballos e Amato do fundo do poço para a alta em poucos dias. Um novo grupo de pacientes está sendo tratado dentro desse protocolo, agora já dentro de técnicas de controle para a produção de um primeiro “paper” com valor científico a cargo do dr. Amato. A indicação que se vai impondo é que quanto antes se passar a esse tratamento mais eficaz ele será.

Não é um tratamento que vá funcionar infalivelmente em todos os casos – a indicação é para aqueles em que a inflamação dos pulmões é a ameaça mais premente. Mas outros médicos consultados para esta matéria recomendam o uso de todos esses recursos juntos em doses que variam de caso para caso. Desde pelo menos os primeiros dias de abril, apurou o Vespeiro, inúmeros pacientes vêm sendo tratados com esse protocolo também no Hospital Sírio Libanês, a começar por um paciente ilustre, o dr. Roberto Kalil, contaminado pelo coronavirus, como se constata pelo vídeo acima em que ele menciona que tomou cloroquina mas “o que o salvou foi o corticóide”.

É um tratamento muito rápido e muito barato, que dispensa UTI’s e respiradores, os dois pontos mais vulneráveis não só do sistema de saúde brasileiro como dos de grande parte dos países do mundo. Mais que qualquer outro fator mais diretamente objetivo, foi o medo do colapso desses sistemas que levou suas respectivas autoridades de saude publica às quarentenas que, ao contrário do que se pensa, não curam nem evitam que a epidemia cumpra seu ciclo (só declinam depois que mais de 50% da população é infectada e torna-se imune), ou seja, não “salvam vidas” diretamente, apenas tentam “espalhar” os casos de hospitalização no tempo.

 “Vá logo para o hospital”

O dr. Kalil faz, aliás, um alerta para uma falha de comunicação que tem tido efeito desastroso. “Procure o hospital ao primeiro sinal da doença. Não espere os sintomas se agravarem. Isso pode ser a diferença entre a vida e a morte“. Kalil registra que o Hospital Sírio Libanês tratou de 300 doentes de coronavirus e só perdeu um, e que o Hospital Albert Eisntein tratou 400 e também só perdeu um paciente. Mas nos hospitais públicos a mortalidade tem sido muito mais alta “porque os doentes estão demorando demais para procurar o hospital“.

“Um número altíssimo já chega morto ou quase morto na ambulância porque, por medo de que isso apressasse o colapso do sistema público, foi feita a recomendação errada, no começo da campanha, para que as pessoas não procurassem o hospital com sintomas brandos da doença. Fizeram até terrorismo, dizendo que o hospital é o melhor lugar para as pessoas pegarem o corona. Agora até pessoas afetadas por outras doenças estão evitando os hospitais até ser tarde demais. É preciso corrigir urgentemente essa informação“.



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