Economia

Ninguém saberá quanto PIB
caiu no primeiro trimestre

DANIEL LIMA - 02/09/2020

O tamanho do tombo do PIB do Grande ABC no segundo trimestre deste ano jamais será conhecido. Tampouco do primeiro. Muito menos do terceiro e do quarto, que fechará o ano. O PIB do Grande ABC deste 2020 só será identificado, sem trimestralidades, em dezembro de 2022.  

Se alguém relacionar essa situação a qualquer coisa que lembre um apagão mental de mais de dois anos não pode ser considerado louco. Pode até ser tratado como louco, embora em totais condições de cognição. Loucos são os outros.  

O mundo inteiro sabe que o PIB do Brasil derreteu 9,7% no segundo trimestre deste ano em relação ao primeiro. O blecaute econômico em forma de isolamento social foi estrondoso. Por que, afinal, o Grande ABC vai esperar tanto tempo (assim como outras regiões) para saber o que se passou durante o período mais tenebroso da economia nacional em 120 anos?  

A resposta é simples: não temos apetrechamento técnico-profissional para acompanhar em tempo quase real, por assim dizer, o andar da carruagem da economia regional. Poderíamos ter, claro.  

Nada que surpreenda 

Bastaria que o Clube do Prefeitos funcionasse. Mas se o Clube dos Prefeitos não funciona para situações mais simples, mais à mão, como esperar algo supostamente mais sofisticado? O vírus chinês está aí a incriminar acomodados e incompetentes que cuidam daquela instituição. Até o conglomerado da Favela da Maré, no Rio de Janeiro, lida melhor com a pandemia do que o Grande ABC.  

Sem contar com um banco de dados atualizado e também sem monitoramento permanente dos resultados econômicos locais, tanto em receitas tributárias próprias como de transferências governamentais, o Grande ABC não enxerga um palmo à frente do nariz de responsabilidade fiscal e comprometimento social.  

Nestas alturas do campeonato, convenhamos, prefeitos e a sociedade em geral deveriam saber os resultados do segundo trimestre de um ano em que o vírus chinês inferniza a vida de todos.  

Muita chutometria  

O que tem saído nos jornais e mesmo assim de maneira pouco consistente, cheirando à chutometria, são conclusões sobre rebaixamento orçamentário. Nada que imponha sustentabilidade informativa e, mais que isso, reativa.  

Tudo seria diferente se houvesse ação construtiva de dados sistêmicos de um grupo de especialistas vinculados aos próprios municípios, pagos que são pelos contribuintes, e possivelmente em parcerias com acadêmicos.  

Medir o comportamento da economia de uma região como o Grande ABC não é tarefa impossível. Longe disso. Dadas as facilidades colocadas à mesa pela tecnologia e o apanhado disponível de dados municipais, estadual e federal, basta um pouco de boa-vontade para tudo se encaminhar de forma efetiva.  

Esperar dois anos pelo desembarque do PIB dos Municípios, como tem sido a rotina naci0nal, é uma barbaridade. A dinâmica econômica não suporta tamanho atraso. Decisões táticas que influenciam definições estratégicas são essenciais.  

Os jornais estão cansados de publicar resultados preliminares do comportamento do PIB Nacional com base na multiplicidade de fontes. Consultorias especializadas intensificam o aparato detector de informações relevantes. Jornais publicam inclusive espécies de rankings de projeções de dezenas de consultorias especializadas.  

Terreno pantanoso  

O Grande ABC amorfo e sem liderança econômica mantêm-se nas trevas. Um ou outro acadêmico se mete ao que chamaria de jogo de adivinhação. Também pratico essa modalidade de vez em quando, com a diferença de que não tenho compromisso com qualquer instituição, não forço a venda de manchetes para jornais e me apoio em dados antecedentes sem me preocupar um tiquinho com ideologia política. Reconheço que o terreno é pantanoso. 

Por essas e outras, raramente dou com os burros nágua. Também não me arrisco demais. Quem não tem reputação – como alguns na praça metidos a aventuras -- não se preocupa com reputação.  

Não sei, não quero saber e tenho raiva de quem diz saber o quanto perdemos no segundo trimestre deste ano em relação ao primeiro. O máximo que posso dizer é repetir o que escrevi quando a epidemia chegou na praça, ao me referir à queda do PIB do Grande ABC na temporada vigente.  

Acredito que será no mínimo de 10%, mais que os atuais 6% previstos para o País. Pesa muito nessa conta o desabamento do setor automotivo, nossa Doença Holandesa.  

Contribuição diferente  

Se fosse instado por alguém que tem poder de mando regional a apresentar proposta colaborativa de como mensurar a cada trimestre o comportamento do PIB do Grande ABC, estejam certos os leitores que o faria com satisfação e, mais que isso, garanto, com luminosidade técnica.  

Não sou economista, não sou econometrista, nada disso, mas disponho de informações, conhecimentos e dados técnicos e culturais suficientes para cercar esse frango no terreiro da viabilidade ético-funcional.  

Não quero dizer com isso que aceitaria participar de qualquer grupo que venha a ser criado, algo de que duvido porque os mandachuvas da região não estão nem aí com a hora do Brasil da economia local.  

Minha cota de interesse em contribuir presencialmente com o Grande ABC se esgotou desde que o prefeito Paulinho Serra deu um passa-moleque no grupo que, a pedido dele, criamos para respaldar de conhecimento econômico a errática administração de Santo André. Era um voluntariado sem interesse qualquer além de contribuir com a cidade e a região.  

Anteriormente, aliás, também estive no Paço Municipal para levar uma sugestão de reforma completa do mapeamento do IPTU, considerando-se metodologia que, em resumo, estaria subordinada às condições econômicas dos contribuintes de diferentes faixas de rendimento e suas respectivas localidades. O prefeito acolheu com entusiasmo para, em seguida, desistir.  

Aliás, antes de tudo isso, para provar que temos um chefe de Executivo despreparado para o futuro, embora faça alardes varejistas que entusiasmem provincianos, conto outra decepção. O faz-tudo da gestão tucana em Santo André, Leandro Petrin, me convidou logo no início do governo para compor uma equipe de voluntários supostamente de elite para auxiliar a Administração. Agradeci e me coloquei à disposição. O pelotão supostamente de lustrados jamais foi concebido.  

Por que conto tudo isso? Para dizer que Desenvolvimento Econômico é tão prioritário no governo de Paulinho Serra (e dos demais prefeitos dessa safra de 2016) como o equilíbrio fiscal o foi antes e depois da redemocratização do País. Tanto militares quanto civis pautaram o desprezo às contas públicas até que chegamos ao ponto que chegamos, com Teto Fiscal imposto pela dramaticidade de inadimplência geral e irrestrita. 

Alarmismo necessário  

Navegar às escuras neste período do vírus chinês como estamos navegando e, mais que isso, projetar que continuaremos assim indefinidamente, são recheios do bolo indigesto de impropriedades administrativas que nos colocam de joelhos ante qualquer possibilidade de recomposição do tecido econômico da região.  

Enquanto o ambiente regional não contemplar um certo grau de alarmismo econômico coletivo explícito, a partir de uma linha de produção de verdades intocáveis tendo a mídia como carro-chefe, o Grande ABC não sairá da pasmaceira em que se meteu a partir dos anos 1980.  

Sim, todo o nosso infortúnio econômico e social começou lá atrás, coincidentemente com o desabrochar do sindicalismo de Lula da Silva. 

A bem da verdade, o ressurgimento do sindicalismo bravio na região não foi o único obstáculo interposto à derrocada. Outros vetores, já analisados aqui, compõem a partitura de uma ópera bufa em que Mercado, Estado e Sociedade acrescentaram descaminhos e individualidades autofágicos.  

Ter de esperar por mais de dois anos pelo que se passou no segundo trimestre deste ano, e, pior que isso, sem saber, para valer, o que realmente aconteceu na região neste segundo trimestre, deveria envergonhar a todos que têm o comando municipal e regional.  

Sem saber o que estamos passando, como desenhar um futuro próximo minimamente confiável? 



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