Tenho algumas idéias de como poderia ser o modelo do Consórcio de Prefeitos. Escrevo estas linhas na tarde de segunda-feira sem reunir informações sobre o resultado da manhã que tratou da contratação da FGV (Fundação Getúlio Vargas) para moldar a nova estrutura dessa entidade supostamente de integração regional.
Divirto-me, no bom sentido do termo, construindo cenários e metas ao dedilhar o computador. Sustento-me em experiências teóricas e práticas de regionalidade. É um aprendizado longo. A estrutura dorsal dessa proposta vale mais pela captura de buracos negros de erros permanentes do que dos clarões de acertos eventuais.
Fundamentalmente, entendo que a urgência das urgências de que o Consórcio de Prefeitos deve tratar está no ramal econômico. O social, queiram ou não, não carece de tanta sinergia. No conjunto, as medidas e as atividades sociais de cada Município do Grande ABC apresentam resultados positivos. Somos especializados em esparadrapos sociais. Nosso problema é mais embaixo. Está na virilha de sustentação da sociedade, que é a economia. Ali as dores são terríveis. O Consórcio precisa se dedicar muito mais a resultados econômicos do que sociais. Até porque, os segundos dependem dos primeiros para continuarem a ser financeiramente capitalizados.
Vamos, então, considerando esse conceito, a algumas proposições. Fica a critério da FGV levá-los em conta ou não:
1) Não coloquem os prefeitos na linha de frente das definições. O corpo técnico é mais importante, principalmente se somar-se a um Conselho Deliberativo formado por membros capacitados e multitemáticos da comunidade. Os prefeitos devem ser preservados para anunciar de forma colegiada as grandes decisões. O cargo de presidente é nocivo, porque enobrece circunstancialmente quem o ocupa e obscurece os demais. E prefeito nenhum gosta de ser figurante. Quando a conta de um protagonista e seis coadjuvantes se configura, como no modelo arcaico que está aí, o estrago é total.
2) Definam urgentemente uma pauta regional com base na contratação de consultoria especializada em competitividade econômica. Não caiam no marasmo de enxergar o Grande ABC apenas como fonte de votos de ações que procuram minimizar o viés social. O elástico de aumento de impostos municipais está-se exaurindo. Chegamos ao ponto de ruptura. O caminho das pedras passa necessariamente pela reorganização do tecido produtivo e, dadas as características fragmentadoras de regionalidade, somente uma consultoria com experiência e independência amarraria as pontas desse novelo de improdutividade.
3) Que a pauta regional seja tão seletiva quanto sistêmica. Isso quer dizer que não adianta querer agarrar o mundo. Precisamos lidar com prioridades. E quando tudo é prioridade, nada é prioridade. O Consórcio de Prefeitos andou se espelhando no modelo esquizofrênico de uma Câmara Regional que nem existe de fato e só poderia mesmo ser contaminado pela dispersão.
4) Não repitam a bobagem autoritária de fechar as portas da entidade à imprensa. Façam exatamente o contrário: envolvam toda a mídia nos encontros para que a comunidade participe das medidas e se sinta, para tanto, co-responsável. Quem esconde informação — como a de que determinados prefeitos só comparecem às reuniões quando detêm o cargo de presidente — assemelha-se em falta de responsabilidade regional aos próprios ausentes.
5) Desenvolvam mecanismos de medição do rendimento dos técnicos que dão suporte à entidade. Na medida em que a agenda for mais restrita, é possível compactar as forças de suporte em torno de objetivos vocacionados à resolução dos problemas. Mais que isso: coloquem esses técnicos e suas avaliações na mídia. Valorizem suas aptidões. Se cada profissional for visto como parceiro da gestão coletiva, os frutos advirão. Mantê-los no anonimato é uma ode à depreciação do talento individual.
6) Estruturem um banco de dados minimamente competente e sintonizado com a agenda de prioridades. Não é preciso agarrar o mundo estatístico. Nada resiste à força de informações confiáveis. O Grande ABC precisa se conhecer nos pontos considerados nevrálgicos para que alcance respostas. Um Rodoanel ou um Ferroanel sozinhos ou juntos não vão fazer o verão de investimentos produtivos esperados. Uma região que não conhece suas próprias realidades será sempre incapaz de corrigir a rota e de estimular projetos de recuperação. Rodoanel e Ferroanel podem ser tanto a salvação da lavoura como presente de grego.
7) Deixem menos recursos para engordar aplicações financeiras e invistam mais em estudos específicos conectados com a pauta de prioridades. De que adianta o superávit orçamentário do Consórcio de Prefeitos se os dirigentes públicos e privados vivem nas trevas de informações estratégicas? O esquadrinhamento do território regional, sobretudo no campo econômico, é questão vital para entender o tamanho do problema.
8) Parem de maltratar a Agência de Desenvolvimento Econômico. Alcem a instituição desgarrada oficialmente dos orçamentos públicos à condição de parceira indissolúvel da entidade. Consórcio e Agência não podem ser pedaços de um quebra-cabeça institucional que jamais se encaixarão por causa de vaidades políticas e pessoais. A separação das duas entidades é algo como erguer um muro na entrada de cada grande área e impedir que os atacantes recebam passes dos zagueiros e dos meio-campistas.
9) Fortaleçam setorialmente a ação econômica com a constituição de pelo menos meia dúzia de atividades vitais para o desenvolvimento regional, sempre na zona de aderência da grande pauta de recuperação do Grande ABC. Montadoras, autopeças, petroquímicas, químicas, comércio e serviços são pontos de relevância à aplicação de terapia rejuvenescedora de nossa economia.
10) Que a Fundação Getúlio Vargas não perca a independência de analisar e monitorar o desempenho do novo Consórcio e que principalmente os membros do Conselho Deliberativo integrado por representantes da comunidade também estejam atentos à independência gerencial da FGV. Não podemos requentar o prato de quinquilharias de boas maneiras que em nada contribuem para mudanças. É indispensável que o Conselho Deliberativo seja independente e crítico no acompanhamento do cronograma de reformas da região. Mas que, também, não caia no facilitarismo de perder o foco. A fixação de metas é indispensável para o conjunto da entidade ganhar racionalidade.
11) Que o Consórcio de Prefeitos fuja do fatalismo desarrumador da casa em períodos eleitorais. A entidade deve ser encarada como empreendimento de toda a comunidade e, como tal, os resultados precisam estar sintonizados com o cronograma de inquietações, não com a aproximação da corrida aos votos. A solução para que esse perfil não sofra desvios está na consolidação de forças que equilibrem o jogo de responsabilidade cuja bola em quase 15 anos do figurino atual esteve sob absoluto e modesto controle dos chefes de Executivos.
Por isso, o ideal seria que o Consórcio mudasse até de nome. Que se abolisse Consórcio de Prefeitos. Que fosse consagrado Consórcio do Grande ABC.
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24/04/2025 GRANDES INDÚSTRIAS CONSAGRAM PROPOSTA