Regionalidade

Só um lunático seria capaz de
propor aeroporto no Grande ABC

DANIEL LIMA - 13/04/2011

O que se pode esperar da Agência de Desenvolvimento Econômico do Grande ABC se ao assumir o cargo de cunho predominantemente político de presidente o gestor imobiliário Valter Moura declara diante de jornalistas passivos que pretende ver construído um aeroporto no Grande ABC?


Há alguns anos foi o então prefeito Leonel Damo, de Mauá, que proferiu tamanha barbaridade. Quando se imaginava que a doidice ficaria no anedotário regional como chute na canela do calendário eleitoral, eis que Valter Moura aparece em cena com repeteco ordinário entre outras razões porque copia a bobagem do original sem ao menos lhe dar crédito.


Resta saber, seguindo o conceito extraordinariamente desafiador do filme Cópia Fiel, se Valter Moura copiou o original ou o original é dele próprio. Só vai entender a charada quem assistir ao filme que tem Juliette Binoche como protagonista.


Portanto, e voltando à realidade, estamos de mal a pior em institucionalidade. Como se já não bastasse nestes dias o escândalo do Ramalhão.


Qualquer iniciativa bombástica que venha de Valter Moura será natural, porque há sinais de esclerose em seus pronunciamentos. Não esclerose biológica, que especialista não sou para detectar assim tão facilmente, inclusive em mim mesmo. Se pudesse, certamente estaria me interditando, porque devo também estar no mundo da lua por acreditar que seja verdade que alguém que ocupe cargo supostamente relevante no espectro econômico do Grande ABC se lance a tamanha idiotice.


No caso de Valter Moura refiro-me à esclerose intelectual, no sentido de que o tempo passou e o eterno presidente da Acisbec (Associação Comercial e Industrial de São Bernardo) não se dá conta de que a pauta social se alterou, e que pauta social, no caso, ganha tamanha elasticidade que fatores de sustentabilidade ambiental deveriam ser rigorosamente avaliados em qualquer tipo de empreitada.


Um aeroporto no Grande ABC equivale no campo esportivo a dizer que Pelé voltaria aos campos de futebol, vestiria a camisa do Corinthians e marcaria novos mil gols. Ou que Júpiter está prontíssimo para um loteamento da Cyrela, já que o mercado imobiliário segue relativamente bombando e não faltam especuladores na praça.


Desafio o novo dirigente da Agência e eterno presidente da Acisbec (tão eterno que está no cargo desde antes da queda do Muro de Berlim, enquanto a sociedade empresarial de São Bernardo, aniquilada, é incapaz de reagir) a contar com respaldo técnico-jurídico-financeiro-econômico que dê viabilidade à construção de um aeroporto no Grande ABC.


Não há condição alguma em qualquer um dos vetores para tanto. A Lei de Proteção dos Mananciais, a Serra do Mar, a logística, a rentabilidade de investidores, a topografia, por qualquer caminho (terra, ar e mar) que se queira adentrar, o que encontraremos será uma série de obstáculos que inviabilizam o empreendimento. Mais que inviabilizam, o tornam motivo de chacotas.


Em qualquer local razoavelmente sério, a posse de um dirigente seguida de tamanha estultice significaria demissão automática por suspeita de incapacidade cognitiva. Mas o que aconteceu com Valter Moura foi exatamente o contrário: os poucos convidados que se deslocaram até a sede da Acisbec, onde um coquetel oferecido pelo anfitrião e beneficiário do cargo animou a todos, os aplausos, embora comedidos, foram gerais. Nada que a formalidade não justifique. Nada que a hipocrisia não industrialize.


Nem Chico Anísio nos melhores momentos de humorismo de mil faces seria capaz de projetar quadro tão hilário. Provavelmente o comediante que anda às turras com a saúde criaria personagem sob medida para Valter Moura. A Lua seria o ponto de referência, é lógico. Não faltaria, provavelmente, no teatro de operações, uma plataforma de embarque para aquele planeta tão distante de todos, mas pertíssimo do dirigente da Agência.


Talvez no fundo, no fundo, este jornalista esteja a perder tempo com o assunto, porque a própria Agência de Desenvolvimento Econômico, em que pese contar com alguns profissionais que honram a camisa e se dedicam a tentar dar alguma face de regionalidade a estudos e ações, não tem peso significativo no mambembe quadro institucional do Grande ABC.


Inspirada pelo prefeito Celso Daniel como linha auxiliar do Clube dos Prefeitos, a Agência de Desenvolvimento Econômico há muito se perdeu num nevoeiro de descontinuidades programáticas que também é a marca registrada da entidade que reúne os titulares dos Executivos do Grande ABC.


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