Imprensa

Reformismo solapado (38)

DANIEL LIMA - 08/03/2007

Estamos caminhando para a fita de chegada da recuperação histórica dos nove meses em que atuamos como diretor de Redação do Diário do Grande ABC. Como se sabe, utilizamos naquela empresa, entre outros recursos de catequese ao Planejamento Estratégico Editorial, uma newsletter, a Capital Digital Online, para nos comunicar semanalmente com todos os colaboradores, inclusive externos à Redação. O material que segue agora é de 23 de março, pouco menos de um mês antes de minha saída daquela empresa. Para felicidade de minha família e o bem-estar geral de meu corpo. Saudades dos companheiros de trabalho, engajados naquele movimento de recuperação editorial.


Grande ABC, quarta-feira, 23 de março de 2005


Editorial descentralizado adensa
compromissos de regionalidade


O conceito de descentralização de poderes e conversão de forças na Redação do Diário do Grande ABC inclui o compartilhamento da produção diária de “Nossa Opinião”, o Editorial do jornal. Sete dos profissionais de cúpula se revezam na elaboração do material, todos sob pressupostos editoriais da publicação exaustivamente debatidos nas reuniões diárias de final de tarde. A orientação-chave, no sentido de que o leitor seja induzido a acreditar que se trata de apenas um único articulista, está na interatividade dos responsáveis pela missão.


A descentralização é extraordinariamente produtiva na medida em que conduz todos os líderes de Redação a estarem atentíssimos aos debates das reuniões de pauta. A visão restritamente temática, comum entre os cabeças de redações convencionais que enxergam apenas seus limites editoriais, sofre, portanto, duro revés. Nossa preocupação é formar uma equipe capaz de se complementar independentemente da área original em que atuam os profissionais. Já se foi o tempo em que jornalista precisava entender e bem só de alguma coisa muito específica. É impossível descrever as agruras da Febem sem valores múltiplos.


Os leitores estão se apercebendo do quanto o jornal valoriza a regionalidade, núcleo de toda a transformação que se opera na Redação e que jamais poderá ser desprezada, sob qualquer alegação. Nossos editoriais são predominantemente direcionados a questões locais. Há o fortalecimento desse viés. Os reflexos dessa política editorial estão nos resultados. A concorrência está em maus lençóis, segundo alguns dados de que dispomos, inclusive de pesquisa realizada pelo Instituto Brasmarket.


Conseguimos nos últimos 10 meses manter nosso market share, enquanto os dois principais concorrentes, Estadão e Folha, caíram fortemente. Os leitores já estão percebendo as mudanças. Ganharemos mais mercado. Podem acreditar. O produto principal de um jornal são as informações, as análises. Por isso o nosso desafio é melhorar a qualidade a cada dia.


A lógica dessa equação é simples: temos de ganhar de goleada o jogo em nosso território. É inconcebível qualquer tipo de ameaça de jornais não sediados aqui, por mais poderosos que sejam. Chega o terreno que já perdemos com descuidos e falta de foco. Um jornal regional tem por obrigação em primeiro, em segundo e em terceiro lugares cuidar de seu território.


Temos de ser uma equipe cada vez mais regionalizada, no sentido contemporâneo do termo. Ainda outro dia escrevi para o “Contexto” uma espécie de resumo do que entendo por regionalidade. Não podemos confundir regionalidade com bairrismo. Aliás, temos de exorcizar qualquer tipo de contaminação nesse sentido. E o que não falta no Grande ABC é bairrismo.


Temos, como equipe, dado provas de constante maturidade. Um exemplo: os mais recentes erros de lançamento do IPTU em Santo André foram tratados com responsabilidade, sem partidarização, sem corporativismo. Desta vez não foram ouvidos vereadores que não produzem nada, mas não desperdiçam oportunidades semelhantes para demagogias. A equipe seguiu as orientações com zelo.


Qualquer que seja o município, qualquer que seja o problema, a abordagem não pode resvalar para o sensacionalismo de ocasião. O jornal não pode ser ferramenta de locupletação de quem quer que seja. Temos sim de ouvir especialistas sobre os mais diferentes problemas. Por isso montamos o Conselho Editorial. Os leitores querem informação analisada, que resista ao tempo e a injunções políticas e partidárias.


O amadurecimento da linha editorial do jornal se reflete na diversidade temática e na convergência conceitual dos editoriais descentralizados. O simples fato de estarem escalados para produzir sua porção semanal de editorial coloca os profissionais da Redação antenadíssimos com tudo o que o jornal acompanha, aguçando o espírito crítico. Isso os conduz a destilar essa mesma impetuosidade avaliativa a seus comandados nas ações mais corriqueiras do dia-a-dia. Ou seja, o ambiente de questionamento, de análise, de interpretação, de regionalidade, de tudo que ajuda a construir um novo jornal, está indelevelmente presente, fertilizado diariamente pela expectativa de interação com os leitores.


Numa linguagem filosófica, diria que todos estamos respirando ares mais depurados na Redação porque, na medida em que nos embrenhamos na regionalidade, mais nos damos conta de que temos uma missão a cumprir que foge do ritual da obrigatoriedade de fechamento puro e simples de cada edição.


Somos protagonistas de um enredo de construção de cidadania regional que poucos souberam aplicar ao longo da história. Por isso não podemos nos deixar levar pelo arrastão da factualidade de prazo de validade tão duradouro quanto uma bolha de sabão. Nosso compromisso com a sociedade deve estar acima de tudo. O outro lado da moeda é que isso nos obriga a nos entregar mais e mais às funções jornalísticas. Não podemos, não devemos e nem seremos apenas simples repassadores acríticos de declarações de terceiros.


A torrente de informações que deságua no final da tarde com a reunião de pauta começa de manhã, como todos sabem, quando uma de nossas lideranças, Lola Nicolás, primeira a chegar, acompanha o movimento de todas as editorias, cujos titulares, que deixam o jornal sempre nos últimos minutos da noite anterior, quando não nas primeiras horas do novo dia, encaminham pautas às respectivas equipes.


A eliminação da reunião de pauta de manhã, decidida pelos editores porque a modalidade se mostrava inócua, cansativa, desgastante, deu lugar a um novo modelo de avaliação do dia que desabrocha, sob a coordenação inicial de Lola Nicolás, num processo que se multiplica ao longo do dia na medida exata em que os editores, os secretários e os secretários-editores vão chegando ao trabalho. Ou seja: trata-se de uma ação coletiva que, ao mesmo tempo em que joga na lata do lixo um sistema antiquado e industrializador de banco de horas, revela-se vigoroso pela complementaridade entre os profissionais.


Uma prova viva, vivíssima, de que a metodologia vem funcionando e muito bem é que o jornal melhorou consideravelmente. Ainda estamos distantes do que pretendemos, mas nos afastamos do emaranhado que produzíamos.


O Diário do Grande ABC de hoje é um jornal muito melhor que o de ontem, mas será fichinha perto do que planejamos para cinco anos. Só ocupamos 15% do tempo programado. Ou mais precisamente oito meses dos 60.


CONTEXTUALIZANDO
Ainda sobre as mãos múltiplas na produção do Editorial: o efeito-cascata de acompanhamento multitemático da Redação acrescentou mais competência a todos os profissionais envolvidos.


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