O governo Lula da Silva não deve desperdiçar a oportunidade que se lhe apresenta. Jornais de hoje estão publicando que o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso reivindica a valorização da figura dos "ex" no organograma federal. Citou como exemplo o ex-presidente dos Estados Unidos Jimmy Carter que, entre outras ações de política internacional, envolveu-se nas negociações de paz para a Venezuela. Perfeito, perfeitíssimo: FHC tem toda razão. Seu talento intelectual expressivamente teórico, sua liderança entre os acadêmicos mais empedernidos, suas relações internacionais forjadas pela multiplicidade idiomática que tanto azucrina e estigmatiza a vida do atual presidente, sua vocação à prática de uma diplomacia insuperável, tudo isso e muito mais o credenciam a uma atividade extraordinariamente interessante.
Fernando Henrique Cardoso tem o meu voto e provavelmente o voto da quase totalidade dos moradores do Grande ABC. Que Lula da Silva o escolha como representante do governo federal na região mais duramente atingida pela abertura econômica nos oito anos do governo do próprio Fernando Henrique Cardoso.
Isso mesmo: ele que produziu a barafunda econômica e social no Grande ABC, ele que trate de minimizá-la. Se conseguir recuperar metade do PIB industrial que perdemos, com funda repercussão em outras atividades, porque respiramos e transpiramos sobrerrodas, que tenha seus vencimentos anabolizados por produtividade.
Isso mesmo, o contrato de FHC para recuperar a economia do Grande ABC que em larga escala ele destruiu ao acelerar o ritmo da abertura econômica que atingiu em cheio o setor automotivo, o contrato de FHC, repito, deve contar com cláusulas especiais de produtividade. Como seria?
Simples: ele teria um pró-labore que desse para custear as despesas básicas adicionais de um ex-presidente com várias aposentadorias e seus vencimentos flutuariam ao sabor de dois elementos básicos: o aumento do Valor Adicionado e da contratação formal de trabalhadores no setor industrial.
Riqueza e emprego
Explico a equação. Primeiro, Valor Adicionado quer dizer produção de riqueza na indústria de transformação. Simplesmente aumentar os valores não significa desenvolvimento econômico sustentado. Como se sabe, investimentos tecnológicos e em processos, além de treinamento e reciclagem dos recursos humanos, garantem maior rendimento produtivo com menor número de trabalhadores.
Por isso, só Valor Adicionado não serve. É preciso que haja aumento do efetivo industriário. Só assim teremos certeza absoluta de que o vendaval fernandohenriquista já passou. Sim, porque não é porque FHC deixou a presidência e sua destrambelhada política de abertura econômica que os efeitos deletérios cessaram. Nada disso. A Volkswagen, a Ford, a General Motores e outras empresas do setor automotivo regional não estão demitindo por demitir. São ajustes longevos, determinados pelos rescaldos de uma competitividade a todo custo, principalmente do emprego.
Só não entendo como não pensei nessa solução antes. Fernando Henrique Cardoso coordenador regional do governo Lula da Silva, eis a grande solução para o Grande ABC. Já imaginaram que interessante seria acompanhar os projetos do ex-presidente para recuperar uma região outrora pujante?
É claro que jamais teremos de volta as pequenas e médias autopeças que se escafederam da região ou morreram de morte matada pela baixa escala de produção, carga tributária isonômica e tantas outras anomalias econômicas. Também os empregos nas grandes fábricas, especialmente nas montadoras, não podem ser recuperados, porque quem abriu tanto a torneira à globalização não terá o antídoto do fechamento sem incorrer em gravidade semelhante, de pecar pelo excesso.
Um Plano Marshall
Então, o que fazer? Dinheiro, dinheiro e dinheiro. Dinheiro e planejamento. Um Plano Marshall para o Grande ABC, porque não se conhece na literatura econômica caso análogo cuja recuperação não se desse pela via de investimentos federais e internacionais. Ninguém melhor que um poliglota para frequentar os corredores de organismos internacionais em busca de financiamentos a juros baixíssimos, não é verdade? Ainda mais com as insígnias de ex-presidente da República.
Espero que o governo Lula da Silva seja lembrado sobre essa sugestão e nos tire de uma quase convicção, depois de seis meses de mandato e de uma estúpida falta de coordenação econômica regional para um Grande ABC atingido em cheio pela insensatez macroeconômica: a sensação de que Lulacá, Urgente!, título-esperança-cobrança da revista LivreMercado edição de novembro do ano passado, não entre para o balanço regional como mais uma grande frustração.
Que se faça a proposta a Fernando Henrique Cardoso. Queremos FHC como coordenador de políticas econômicas do governo Lula da Silva no Grande ABC. Ninguém mais apetrechado do que o ex-presidente para desatar os nós que ele próprio criou, contando com a omissão generalizada das autoridades públicas, dos sindicalistas, do empresariado, dos agentes sociais e dos agentes econômicos de um Grande ABC que se considerava indestrutível e muito acima da vergonhosa realidade de ver a ociosidade física de uma fábrica que se foi, no caso a Volkswagen Caminhões, invadida por milhares de sem-teto, de sem-esperança.
Chamem FHC e lhe entreguem a missão de justificar como ex-presidente da República o que foi incapaz de promover como presidente, ou seja, a transposição de um Brasil autárquico, improdutivo, perdulário, corporativista e privilegiador explicitamente identificado no Grande ABC de ontem para um País moderno, dinâmico, pluralista, competitivo e menos desumano no qual ainda esperamos ver traduzido o Grande ABC de hoje destroçado industrialmente, apático institucionalmente, subjugado socialmente e acovardado culturalmente.
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