Não é porque está sempre nas nuvens que José Carlos Brunoro se distancia da realidade terrena. Um dos raros produtos intelectuais de exportação do Grande ABC, Brunoro já está no sétimo passaporte. Só neste ano foram 79 viagens aéreas. No ano passado passou 490 horas dentro de aviões, sem contar o tempo consumido nos aeroportos e translados. Tanto vôo dá exatamente a média de 1h34 de viagem por dia.
Consultor esportivo, depois de vitoriosas passagens pela diretoria de esportes da Pirelli de Santo André e do consórcio Palmeiras-Parmalat, Brunoro acrescenta ao currículo multiesportivo a Fórmula-1, como manager do piloto brasileiro Pedro Paulo Diniz, da Ligier. Depois de marcar história no voleibol e no futebol, colecionando títulos e prestígio, ele já soma dois anos de automobilismo. Mas ainda está insatisfeito. Tanto que resolveu elevar seu trabalho ao paroxismo: está estruturando a primeira empresa brasileira de recursos humanos na área esportiva.
Falta acertar detalhes com um sócio de confiança e dinheiro para o projeto, mas a empresa de Brunoro, cuja logomarca ainda não é prioridade, vai se instalar nos Jardins, na Capital. Será um conjunto ambicioso de atividades voltadas à indústria do próximo século. "O entretenimento ocupará grande parte do tempo das pessoas nos próximos anos, por causa da busca pela qualidade de vida e pelo retorno que oferece aos patrocinadores" -- comenta.
Sem a Parmalat
De olho nesse filão, Brunoro surpreendeu a todos há poucos meses quando deixou o cargo de diretor de esportes da Parmalat. Foi uma decisão corajosa. Os cinco anos de Palmeiras-Parmalat lhe foram pródigos em consagração. Tanto quanto na Pirelli e na Seleção Brasileira de Voleibol. O time que estava na fila havia 17 anos ganhou três títulos estaduais e dois brasileiros. Mais do que isso: ele inaugurou inédito sistema de cogestão entre empresa e clube de futebol. Tornou-se, queira ou não, o principal dirigente do Palmeiras.
Por que saiu? Saiu por que? Brunoro simplesmente queria lançar-se numa carreira solo. Foi liberado sem traumas por Giani Grisendi, o charmain da Parmalat na América Latina. Tanto que pôde se dedicar integralmente à carreira do piloto filho de Abílio Diniz, dono do Pão de Açúcar, inclusive com patrocínio da multinacional italiana.
A sobrecarga de trabalho e o limite de crescimento hierárquico e financeiro sinalizaram que estava na hora de deixar a Parmalat. Tornara-se vítima do próprio sucesso. Brunoro cuidava de Pedro Paulo Diniz e também dos interesses do Palmeiras, do Juventude de Caxias, do Santa Cruz do Recife, do Universidade Católica do Chile e do Chacao da Venezuela, outros clubes patrocinados pela Parmalat. Era demais. Fosse comodista, poderia ajeitar-se por anos a fio na empresa. Integrava espécie de board para a América Latina juntamente com Giani Grisendi e outros quatro executivos. As reuniões não tratavam só de esporte, evidentemente. Afinal, Brunoro transformara-se num profissional de marketing.
Administração interessa
Foram encontros que lhe despertaram o interesse por Administração. Está inclinado a ingressar numa faculdade, reforçando o currículo formal de professor de Educação Física e técnico de futebol. Até porque, prestes a empreender numa organização que vai tratar o esporte como produto cuja demanda do mercado desponta tão interessante quanto o de comunicações, ele precisará aprofundar-se em tecnologia de gestão. Fala espanhol e italiano com desenvoltura e está melhorando o inglês. Brunoro se globaliza.
Aos 47 anos, mantém-se solteiro. Mas a cidadela pode estar caindo. Uma psicóloga gaúcha de 26 anos, cuja foto exibe com olhar apaixonado no escritório montado na ampla cobertura de 400 metros quadrados no Bairro Jardim, em Santo André, parece lhe fazer a cabeça e o coração. "Casamento não me preocupa, acontece" -- afirma com o olhar matreiro de quem tenta parecer feliz por chegar próximo de meio século de vida sem dividir espaços. Cristina, a gaúcha, tem sido companhia mais constante nos intervalos que a carreira de Pedro Paulo Diniz e os novos projetos lhe oferecem.
Semana sim, semana não, lá vai Brunoro, sempre de avião, é claro, para o Principado de Mônaco. Num pequeno escritório, com apoio de um assessor, cuida da próxima corrida de Diniz. É o ponto de partida para acompanhar pessoalmente todos os preparativos. Já virou personagem obrigatório nos bastidores do circo da Fórmula-1. "O automobilismo tem uma organização fantástica. É uma dessas coisas que não se pode desconhecer" -- afirma um Brunoro que já se incorporou como empresário. Diz que as emoções dos jogadores de vôlei e de futebol se assemelham ao comportamento dos pilotos. "As angústias, o sucesso, o fracasso, as reações com o crescimento da carreira, tudo isso se parece nas três modalidades. A diferença está na organização. A Fórmula-1 é demais" -- afirma.
É todo esse histórico de relacionamentos pessoais e administrativos que Brunoro pretende aplicar na empresa que está montando. Ali ele vai fazer de tudo. Desde manter contratos com profissionais de várias modalidades, atuando transparentemente como intermediador de passes, algo que o mundo do futebol, principalmente, transformou num jogo obscuro e repleto de trambicagens, até orientá-los a se comportar com a mídia, a investir seus rendimentos, a proteger-se juridicamente. Enfim, a serem profissionais também fora de campo.
Múltiplas atividades
Haverá espaços também para os clubes. Brunoro pretende assumir a administração executiva nas mais diferentes modalidades. Colocará profissionais especializados nas respectivas funções. É a terceirização no mundo esportivo. Sem contar que poderá atrelar ou não a tudo isso contratos de patrocínios e eventos. Enfim, um shopping de serviços na área.
Conhecer mais e mais os meandros da administração esportiva para aplicar na empresa que já está surgindo inclui também estágio na badalada NBA, responsável pelo campeonato profissional de basquetebol dos Estados Unidos e, segundo Brunoro, ao lado da Fórmula-1, o que existe de mais revolucionário no esporte. NBA e Fórmula-1 extraem do esporte o máximo de emoções com a indispensável organização empresarial. Algo estratosfericamente distante das entidades dirigentes e da quase totalidade dos clubes brasileiros. Um modelo que vai ruir, garante Brunoro. Evidentemente, com sua providencial interferência. É provável que, mesmo sem ter medo de avião, ele consiga passar mais tempo na terra do que no céu.
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21/01/2025 PAULINHO, PAULINHO, ESQUEÇA ESSE LIVRO!