Quem vê a arquiteta de interiores Ângela Tasca brilhando nos salões sociais e profissionais na qualidade de vencedora sequer imagina os obstáculos que enfrentou no início de carreira, há 20 anos. A começar pelo desestímulo por parte da família e do marido, que lhe conferiam apenas o papel de supermãe, supermulher e superfilha.
Muita água rolou desde a infância no Bairro Cerâmica, em São Caetano, onde estavam reunidas as casas de toda a família Tasca. Italianos são assim mesmo, gostam de morar pertinho uns dos outros. Foi nesse bairro que o avô de Ângela, um dos primeiros comerciantes da cidade, instalou armazém e onde sua mãe criou os filhos cercados por plantas e carneiros. Vem daí a paixão de Ângela por animais: em sua casa, um lindo bangalô em estilo alpino no Jardim São Caetano, há um papagaio atrevido, uma arara barulhenta e um cachorrinho basset, neto direto do famoso cão amortecedor dos comerciais da Cofap. O bichinho tem nome de registro, mas o apelido é Bud, numa explícita alusão à preferência etílica da família, a cerveja Budweiser.
Adolescente padrão dos anos 60, Ângela estudava e ia a cinema e bailinhos. Sempre acompanhada por alguém da família, claro! Mãe e avó a prepararam para o casamento, ensinando os segredos de uma vida harmoniosa em família. Os melhores quitutes de seu receituário aprendeu com a avó. São receitas especiais que arrancam elogios dos felizardos que privam de sua mesa. Durante o tempo em que só cuidou da família e não trabalhou fora, Ângela Tasca exibiu sem economia os dotes culinários. Agora com a agenda cheia de compromissos profissionais, só vai ao fogão para preparar, na véspera de Natal, uma especialíssima canja italiana com capeleti. A iguaria tem momento certo para ser apreciada e até mesmo disputada: após a ceia de Natal, quando a casa fica aberta a noite toda à espera de seus amigos e dos filhos, além da família da irmã Vera Monari. A festejada canja é literalmente devorada durante a madrugada, para equilibrar o fígado após a comilança e a bebedeira que marcam a ceia natalina. Tirando a canja, Ângela nem lembra que tem fogão.
A falta de tempo, por sinal, tem deixado a arquiteta muito pensativa. Foi obrigada a afastar-se de muitas coisas que gostava de fazer, como participar mais da vida dos filhos Maurício, Marcelo, Marta e Murilo. Ela comenta, com certa nostalgia: "A gente luta, luta, luta para conquistar o próprio espaço; conquista-o e, de repente, percebe que largou muita coisa no caminho: as raízes, os papos descompromissados com amigos. Não há tempo para curtir mais nada. Vem o receio de a gente mudar o modo de ser. Por isso rezo muito, todos os dias, para agradecer a Deus por ter me ajudado a conquistar tudo o que almejei e também por me conservar como sempre fui. Não quero me deixar contaminar pelo sucesso".
Uma ampliação de foto sobre o piano mostra o casamento dos pais. Os antigos comentam que até hoje não houve cerimônia tão bonita quanto aquela em que a mãe de Ângela entrou na Igreja Santíssima Virgem, em São Caetano, precedida por 16 damas de honra. Estava selada a união das famílias Massei e Fedato. Os Massei eram fortes na política da cidade e disputavam os eleitores com a família Campanella. Os dois lados elegeram prefeitos: Oswaldo Samuel Massei e Anacleto Campanella. A disputa entre as duas famílias era acirradíssima! Tanto que, quando Ângela começou a namorar Luís Tasca foi um Deus-nos-acuda! Ela, Massei. Ele, Campanella. Era demais para pais e avós. No melhor estilo Montecchio e Cappuletto.
Mas o tempo, que quase tudo resolve, ajeitou as coisas e os dois se casaram. Por mais compreensivo que Luís fosse, não conseguia entender a ansiedade de Ângela em trabalhar fora, ir além de cuidar da casa, do marido e dos filhos. Para ocupar o tempo livre, ela resolveu cursar decoração em São Bernardo, durante dois anos. Mas era um curso mais para o social do que para o profissional. Já estava se preparando para trabalhar na área, apesar do desestímulo da família e do marido. "Trabalhar pra quê? Você não precisa nem sabe trabalhar?" -- dizia ele.
Isso pareceu um desafio e, como boa oriundi, Ângela decidiu que conseguiria emprego como decoradora. Não demorou muito, apresentou-se em uma loja de móveis e decoração em São Paulo, atrás de um anúncio de meio período. Era perfeito! Acertou detalhes de salário e horário e começou a nova rotina: após o almoço, levava as crianças à escola, ia para o trabalho e, no fim da tarde, buscava os filhos e retornava para casa. Fazia isso escondida do marido. Ângela visitava clientes, desenhava pequenos projetos, aprendia com tudo o que lhe era oferecido. Tirava o pó, varria a loja, passava pano, enfim, submetia-se a trabalhos físicos para o objetivo de se tornar profissional. Depois de um ano, com o marido a par da nova atividade, resolveu montar negócio próprio com outro decorador da loja. A sociedade não deu certo. Ângela partiu para carreira solo em escritório adaptado na garagem de casa, no Bairro Cerâmica. Passava noites, madrugada adentro, desenhando projetos que seriam mostrados a amigos e eventuais clientes.
A carreira deslanchou mesmo quando ficou viúva, há sete anos. Começou a frequentar eventos de decoração e foi fazendo amizades. Um dos amigos a indicou para decorar um dos ambientes na badalada feira Equipotel. Tratava-se de um corredor e um jardim de inverno rejeitados pelos demais expositores, mas, sob a batuta de Ângela, transformaram-se em locais aconchegantes. Por ironia, tornaram-se o point de arquitetos e decoradores da feira. Foi esse espaço que detonou a carreira de Ângela. Um empresário de Campinas, Jorge Raful, encantou-se com o trabalho e contratou-a para decorar sua mansão, uma área de seis mil metros quadrados em elegante condomínio em Campinas. Por meio do imbatível boca-a-boca a clientela aumentou consideravelmente. Convites para feiras e eventos de design e decoração não pararam de chegar. Foi quando Ângela sentiu necessidades de conhecer outros países e culturas para aprimorar o que já tinha inato: a criatividade e o equilíbrio de formas e cores. Hoje seu currículo registra participação nas mais festejadas feiras internacionais de design e hotelaria, realizadas anualmente em Milão e Chicago.
Em 1998 Ângela participou de 10 eventos do gênero, sempre com a disposição do início de carreira. Quando abraça o projeto de um estande, fica até 48 horas sem dormir e faz qualquer tipo de trabalho: ajuda a pintar paredes, estica e ajeita forração junto com o tapeceiro, pega no martelo para auxiliar o marceneiro, mexe com pá junto com o pedreiro e divide a espátula com o gesseiro. Nessas ocasiões, almoçar e jantar, nem pensar! Ela é habituée de carrinhos de hotdog. Devora sanduíches com tudo a que tem direito, já que não tem problemas com a balança. E o faz com a mesma elegância com que encara um jantar no Fasano ou no Leopolldo.
Ângela tem fascínio pela profissão. Sempre mergulhou fundo no que faz. "Gosto mais da fase de obras do que da etapa de decoração. Sempre amassei muito barro, pisei em massa e tijolos. É assim que a gente aprende. Depois que o projeto fica pronto, lavo o chão, varro, passo pano. Gosto de entregar tudo limpinho para o cliente, e olha que não faço esse tipo de trabalho na minha própria casa" -- confessa. Ângela Tasca conquistou lugar na bíblia de design e decoração do Brasil, o Anuário de Decoradores. Em 1997 participou do Especial Home Cinema e Especial Escritórios e em 98 do Especial Cozinhas.
Além da decoração, sua outra grande paixão é a política, graças à convivência desde a infância com as campanhas do tio Oswaldo Massei. Ela e os primos envelopavam cédulas que seriam distribuídas aos eleitores -- era assim que a votação funcionava nos anos 50. E como política é um jogo de apoios e alianças, chegava ajuda das demais cidades da região. Dessa época, Ângela guarda na memória um ícone da maioria das mulheres do Grande ABC: a líder política Tereza Delta, ex-prefeita de São Bernardo e primeira mulher a ocupar o cargo na região. Tereza conhecia tudo sobre política e estratégia em eleições. Quando visitava os avós de Ângela, juntava ao redor adultos e crianças e os hipnotizava com sua voz de comando e capacidade de liderança.
Dessa época, o fato mais marcante para Ângela, que tinha seis a sete anos de idade, foi a estratégia sugerida por Tereza para retardar a saída dos carros de aluguel que levavam os eleitores às urnas: a líder bernardense levou muitos sacos de batatas pequenas para os Massei. Essas batatinhas, com ajuda da criançada, eram colocadas no escapamento dos carros e o atraso era inevitável. Claro que em prejuízo do adversário Campanella.
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21/01/2025 PAULINHO, PAULINHO, ESQUEÇA ESSE LIVRO!