Uma das 50 entidades homenageadas com o Prêmio Bem Eficiente 2000, da Kanitz & Associados, a Comunidade Inamar, em Diadema, é verdadeira franquia de serviço assistencial. Criada há 30 anos no Jardim Inamar com a missão de acolher e educar crianças carentes da redondeza, a instituição extrapolou os próprios muros para administrar centros educacionais instalados em empresas do Grande ABC e da Baixada Santista.
Além da sede erguida na periferia de Diadema e da Creche Cecília Meireles, no Bairro Serraria, também no Município, que acolhem 340 crianças, a Comunidade Inamar é responsável pela gestão das creches locais da Kentinha, Segeer Reno, Metagal e Irmãos Parasmo; além da Rodrimar, em Santos. A entidade é responsável também pela creche da Aldeia SOS no Riacho Grande, em São Bernardo, e pela creche remanescente da Fertilizantes Copas, empresa que faliu em Santo André. Ao todo são 800 crianças sob os cuidados da instituição fundada por Franco Rigolli, que imigrou da região italiana de Parma como voluntário no início da década de 60.
A sede no Jardim Inamar e a Creche Cecília Meireles são mantidas basicamente com repasses de recursos públicos, sobretudo municipais. Já as unidades instaladas nas empresas representam modelo bem-acabado de sinergia entre iniciativa privada e Terceiro Setor. As empresas entram com espaço físico, carteiras, materiais didáticos e dinheiro para manutenção. A Comunidade Inamar cede professores, metodologia de ensino e recreação.
A primeira empresa a montar uma creche em parceria com a Comunidade Inamar foi a vizinha Kentinha, no início dos anos 80. São 20 crianças monitoradas por dois funcionários da instituição na empresa especializada em embalagens. Depois vieram a Segeer Reno, que atende a outras 20 crianças, a Metagal, que mobiliza 16 professores e auxiliares para cuidar de 100 crianças, e a Irmãos Parasmo, com dois funcionários e 20 crianças. Com a falência da Fertilizantes Copas, a creche para 80 crianças e com 14 funcionários passou a ser mantida com apoio financeiro da Rotedali, empresa de serviços urbanos de Santo André. O núcleo educacional criado em parceria com a santista Rodrimar e o Poder Público local, que cedeu espaço físico no Morro do Ilhéu Alto, é o mais recente. Começou a funcionar em março, com 80 crianças e 20 funcionários.
As parcerias não geram superávit no balanço da Comunidade Inamar para eventual reinvestimento social. Os recursos financeiros conveniados com as organizações são utilizados exclusivamente para pagamento de funcionários e materiais didáticos. "Preferimos cobrar o suficiente para a manutenção, de modo a não sobrecarregar os custos para as empresas" -- expõe a coordenadora e assistente social Marinisa Carminetti Baptista, há 15 anos na instituição.
Marinisa explica que as parcerias representam caminho precioso para expandir a atuação sem depender exclusivamente de recursos governamentais. A Comunidade Inamar dispõe de tabela minuciosa de custos de manutenção, para facilitar o entendimento de empreendedores interessados em parceria, e até disponibiliza projeto arquitetônico para agilizar a implantação. Só é inadmissível para a diretoria eventual interferência na filosofia de trabalho. Tanto que a Comunidade Inamar não se associa com organizações que pretendem criar creche exclusivamente para filhos dos funcionários. Exige que o benefício seja estendido também às crianças carentes da comunidade vizinha. "Não nos colocamos à disposição das empresas. As empresas é que se colocam à disposição de uma idéia" -- sintetiza Marinisa.
Assim como as franquias comerciais e de prestação de serviços -- que têm formato semelhante em qualquer parte do mundo --, a Comunidade Inamar procura manter uniformidade de atendimento e metodologia didática. Para tanto, promove encontros periódicos na sede do Jardim Inamar entre profissionais das diversas unidades. Os coordenadores se reúnem semanalmente, durante duas horas, para trocar idéias e experiências com a diretoria e a coordenadora-geral. A cada 15 dias são programadas reuniões mais amplas -- durante quatro horas aos sábados -- com a participação adicional de professores.
As reuniões quinzenais são divididas em duas partes. Na primeira discute-se planejamento. Na segunda fala-se a respeito de tema de interesse comum. Além disso, a entidade promove encontros semestrais, de cinco dias, para apurar a sintonia das equipes. Como preparativo para as reuniões gerais, professores e auxiliares de cada núcleo participam de encontros diários de 15 minutos para levantar problemas de rotina. "Assim, as reuniões gerais se tornam mais produtivas. Todos vêm com pauta de discussão" -- explica Marinisa.
O trabalho padronizado nos nove núcleos contempla atividades didáticas e de lazer, alimentação balanceada e descanso. Tudo que crianças moradoras em favelas e em áreas de risco não teriam se dependessem apenas do nível cultural e das condições financeiras dos pais. A renda familiar média, de acordo com pesquisa da instituição, é de dois salários mínimos. "A maior parte dos pais não tem profissão definida. Trabalham como ajudantes gerais e faxineiras" -- afirma Marinisa. Ela lembra que o trabalho da equipe de assistentes sociais é prospectivo: fazem contato com moradores da periferia para descobrir quem mais necessita de atendimento.
As crianças tomam café-da-manhã ao chegar, a partir das 7h30, almoçam e têm lanche da tarde antes de sair, às 17h. "Todos dormem depois do almoço. Pesquisas comprovam que dormir é essencial para crianças, mais que para adultos" -- destaca a coordenadora. As atividades didáticas e de lazer com orientação de professores são divididas por faixa etária, de modo a respeitar o estágio de desenvolvimento intelectual e de coordenação motora.
No núcleo do Jardim Inamar os alunos exercitam-se em parque, quadra de esportes e participam de atividades de expressão corporal, de ritmo e canto, além de frequentar salas de aula. O rodízio de atividades é intenso. "Eles nunca fazem a mesma coisa por mais de 30 minutos, para não se desinteressarem" -- afirma Marinisa. O raciocínio de fazer menos, mas com vontade, também vale para os professores. Eles trabalham não mais que quatro horas e 45 minutos por dia. "É para não haver prejuízo na capacidade de concentração" -- completa a coordenadora.
A estrutura operacional da Comunidade Inamar é mantida sobretudo com recursos públicos. São R$ 31,6 mil por mês repassados pela Prefeitura de Diadema, R$ 7,3 mil pelo governo do Estado e R$ 6 mil de convênio com a Fundação Abrinq para sustentar o núcleo no Jardim Inamar e a Creche Cecília Meireles. São desembolsados R$ 113 por mês com cada criança, valor muito inferior ao custeado pelas três esferas do Poder Público brasileiro.
A racionalidade gerencial da Comunidade Inamar é aferida e dissecada publicamente pela auditoria da Trevisan Auditores e Consultores. A organização paulistana comandada por Antoninho Marmo Trevisan passou a atender voluntariamente a Comunidade Inamar em 1997 por indicação de Fernando Levy, diretor da Kentinha. "A transparência proporcionada pela auditoria externa foi fundamental para a conquista do Prêmio Bem Eficiente" -- comenta Marinisa.
Transparência também é palavra-chave para a escolha da Comunidade Inamar como beneficiária de recursos do WCF, instituto liderado pela rainha da Suécia que se dedica a ajudar entidades beneficentes em países de Terceiro Mundo. Das 11 organizações brasileiras escolhidas em fevereiro, a Comunidade Inamar constou entre as três do Estado de São Paulo, ao lado da Gol de Letra, do jogador Raí, e do Cepac, Centro Educacional para Adultos e Crianças, de Barueri. A Comunidade Inamar terá direito a R$ 5 mil mensais durante 12 meses. "Pretendemos contratar um especialista em língua portuguesa para reciclar os professores, além de estagiário em assistência social para realizar trabalho de acompanhamento de ex-alunos. Queremos medir de que forma a educação recebida na instituição se reflete na vida social" -- afirma Marinisa.
A diretoria da Comunidade Inamar também se anima com o apoio de empresas sensibilizadas com questões sociais. A Pierre Alexander, especializada em cosméticos, estendeu o consultório oftalmológico de seus trabalhadores para alunos e funcionários da entidade. Além de consultas gratuitas, a empresa custeou óculos para oito crianças. A Cosnal, que administra o restaurante da Pierre Alexander, colocou nutricionistas à disposição das cozinheiras da instituição para melhorar o cardápio. Outro exemplo: a VRB, empresa de construção civil sediada no bairro nobre do Itaim, em São Paulo, ajuda a instituição há três anos. As obras mais recentes são pintura, reforma da quadra e de telhados.
A ampliação do núcleo do Jardim Inamar é antigo sonho que os diretores da instituição esperam ver concretizado com apoio da iniciativa privada. Com a construção de mais nove salas de aula e ampliação da cozinha, seria possível somar 180 crianças às 280 atuais. A planta já foi até preparada pela VRB. A obra encurtaria a fila de espera de 1,2 mil crianças.
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21/01/2025 PAULINHO, PAULINHO, ESQUEÇA ESSE LIVRO!