Imprensa

Ombudsman de verdade põe
os leitores em primeiro lugar

DANIEL LIMA - 31/08/2021

Com a dupla experiência de ombudsman oficial do Diário do Grande ABC e também com a cara de pau de ombudsman não autorizado de outros jornais, digo e repito para todos ouvirem às margens da tolerância diplomática: o ombudsman da Folha de S. Paulo é por demais generoso. Persistentemente generoso. Bem diferente do ombudsman encardido que sou e não nego, oficialmente ou não dos veículos de comunicação.  

Responsabilidade social vai muito além de corporativismo. É um compromisso que custa caro, mas vale a pena.  

A coluna de domingo da Folha de S. Paulo é prova, mais uma prova, de que o ombudsman do melhor e do pior jornal do País não atende às necessidades dos leitores. Como a ombudsman anterior também não atendia.  

A Folha de S. Paulo faz do ombudsman da vez uma roupagem de suposta democracia avaliativa. Não é nada disso. O “outro lado “mencionado pelo ombudsman José Henrique Mariante, é uma falácia. A “pluralidade”, que o ombudsman não ousou mencionar, é uma ilusão. Pode até constar do Manual de Redação, mas há muito foi descartada da linha editorial. 

Cadê o outro lado?  

Sob o título “Outro lado, teoria e prática”, vou reproduzir os primeiros trechos da coluna de domingo do ombudsman da Folha de S. Paulo de domingo: 

 “Ouviu o outro lado?”. Qualquer repórter que tenha trabalhado na Folha já ouviu esse questionamento. Não é uma pergunta retórica. Está no Manual (págs 74 a76) do Projeto Folha. “O outro lado é elemento integrante da apuração, e não mera declaração a ser registrada burocraticamente”. Há regras até para o destaque a ser dado à versão dos afetados pela reportagem, pessoa ou entidade. O jornal apanha ao fazer o outro lado. Frequentemente é acusado no Painel do Leitor de não cumprir o próprio Manual, de não ter procurado as partes ou dado tempo razoável para explicações. Muitas vezes isso não é verdade, apenas argumento de assessores de imprensa e advogados no intuito de criar dúvida sobre determinado conteúdo publicado.  

Versão única   

Não vou me reportar ao conjunto da obra da coluna do Ombudsman da Folha de domingo porque é dispensável. O jornal tem praticado há muito tempo o que chamaria de versão única que claramente procura desestabilizar o governo federal quando vista sob a ótica do Consórcio de Imprensa. Uma burrice sem tamanho, porque o próprio governo federal é especialista na tarefa. No fundo, são duas máquinas trituradoras que se retrodestroem.  

O tempero de suposta equidade de tratamento da Folha de S. Paulo a outros agentes políticos é falso, um ensopadinho de gosto duvidoso, porque o volume crítico ao atual presidente prevalece. Outros atores políticos, como o governador do Estado e o prefeito da Capital, apenas para exemplificar, são descartados. Só aparecem de vez em quando justamente para dar coloração multipartidária à linha editorial.  

A abordagem do Ombudsman da Folha quanto ao “outro lado” é frágil. Qualquer noticiário pode ser impecável sob o ponto de vista formal de ouvir o outro lado, mas o que se faz com as declarações do outro lado é que estabelece a diferença na abordagem jornalística e na mensagem consumida.  

A Grande Mídia faz do outro lado o que também a pequena e a média mídia estão cansadas de fazer, como vemos no Grande ABC: um jogo de prestidigitação editorial mais que viciado. O que prevalece aos consumidores de informações é a manchete, os primeiros parágrafos, espécies de carro-chefe à formação de opinião.  

Esperteza editorial  

As últimas linhas reservadas malandramente ao outro lado são últimas linhas desprezíveis. O verdadeiro outro lado, que não existe em larga escalada na mídia impressa nacional, deveria ser o outro lado incrustrado na manchete, nos primeiros trechos, contraditando o lado oficial. Esse outro lado, irmão siameses do lado oficial, é um outro lado jogado na beira da estrada da esperteza editorial.  

O outro lado da Folha de S. Paulo que o ombudsman da Folha de S. Paulo não questiona jamais sob o ponto de vista dos leitores mais exigentes é um outro lado jornalisticamente fajuto, porque enganador.  

Daí a lógica da recusa de terceiros em contestarem e, ao se fecharem a explicações, agravam a seletividade informativa.  

Estou atento à atuação do Ombudsman da Folha de S. Paulo. Tenho observado faz muito tempo, antes dele portanto, que parece não constar mais do Manual de Redação qualquer menção ao verbete “pluralidade”.  

Criativo na previsibilidade  

A Folha se tornou um jogo tão previsível, embora criativo como nenhum outro, que é muito pouco provável que uma sequência de edições contemple qualquer coisa que não caracterize a polarização destes tempos – com o maniqueísmo de observar pecados apenas de um lado, o lado da Folha de S. Paulo.  

A Folha, que instrumentaliza o Datafolha, é a mais organizada máquina jornalística do País, ao lado da Organizações Globo. Faz um jornalismo profissional de alto nível, mas não imune a parcialidades, imprecisões e manipulações. É uma obra-prima que se impõe também em forma de fake news. As redes sociais são rudimentares na especialidade.  

Para não dizerem que não falei das flores do que chamaria de independência para valer de ombudsman, recorro a dois dos muitos artigos que escrevi, como ombudsman autorizado do Diário do Grande ABC.  

Foi uma passagem rápida, de pouco mais de duas dezenas de textos da coluna “Contexto”, em 2015. Um ombudsman tão incômodo (e não só ao jornal) que não poderia durar muito mesmo. Nada mais pecaminoso que trair os eleitores.  

Faltou manchetíssima  

do desabafo de Lula   

 Daniel Lima -- 28/06/2015   

 Este Diário engatou uma semana de manchetíssimas bem encaixadas, sempre considerando o decálogo de regionalidade publicado em 11 de maio. Não fosse a ausência do desabafo do ex-presidente Lula da Silva sobre o esclerosamento do PT no topo de todas as manchetes de Primeira Página, a semana que começou no sábado e terminou na última sexta-feira teria recuperado os descaminhos da anterior. Lula fora da manchetíssima, portanto, foi um erro grave. Como também ficou fora da Primeira Página, o erro se tornou gravíssimo. Poderia ter estado em chamada conjunta com as novas bobagens do prefeito Luiz Marinho que, naquela edição, voltou a atacar este jornal. Portanto, a melhor resposta à epilepsia vernacular de Marinho foi dada por Lula da Silva, seu dileto primeiro amigo. Já imaginaram Marinho e Lula, numa montagem gráfica, olhando um para a cara do outro, o primeiro dizendo que este jornal é uma porcaria, como disso, e o segundo afirmando que o PT virou o fio?   

Mais ombudsman   

 Costumo dizer que as manchetíssimas são o resumo do jornal como um todo. Seja qual for o jornal. Este Diário vive nova fase, de rompimento com forças que o sequestram ao longo dos anos, quando a riqueza regional com a comissão de frente da industrialização poderia ter fomentado acúmulo de conquistas editoriais pétreas. Essa turma de malfeitores é formada por pessoas e entidades que não estão à altura das demandas econômicas e sociais. Essas mesmas pessoas e essas mesmas instituições, com os mesmos nomes ou com antecessores do mesmo quilate, são em larga margem individualistas, quando não grupais, voltadas a interesses próprios. E a sociedade como um todo que se lixe.  

Mais ombudsman  

 Ao começar a mexer no vespeiro do mercado imobiliário, ao cutucar as associações comerciais, ao apontar as fissuras do setor industrial, reconhecendo a desindustrialização, ao pegar no pé dos prefeitos entre outros motivos porque não dão à Educação o devido cuidado, ao fazer tudo isso mesmo que de forma ainda reticente, este Diário sinaliza que contribuirá para novo perfil de representatividade social. Aliás, é justamente por estar atento e mesmo monitorar essa nova postura, inclusive com o apontamento de determinadas direções, que este profissional entende que não é ombudsman, mas muito mais que ombudsman desta publicação.   

Mais ombudsman   

 Seria ombudsman se atuasse com estrutura física e de recursos humanos, além de olhar de ombudsman, sobretudo no relacionamento com os leitores. Minha posição é diversa. Fico como sentinela prontíssima para intervir. Contribuo a pedido deste próprio jornal com a ocupação de espaço conceitual na sociedade, apertando-a no sentido de que saia do marasmo sistêmico. É natural que este Diário não pode frustrar expectativas. Terá de passar por cima de muitas dificuldades sobrepostas desde muito tempo. Principalmente de limitações do quadro de Redação. Fosse o Grande ABC megacidade, não região, deformação patrocinada pelos emancipacionistas do século passado, haveria menos complicações à prospecção de informações.   

Mais ombudsman   

 Imaginem os leitores como dá trabalho atuar em sete municípios conurbados, mas com a realidade de bicho de sete cabeças? Pautas de caráter regional, mais elucidativas em vários pontos, são muitas vezes desconsideradas em favor de abordagens municipalistas. A linha de produção diária assim determina o encontro com os limites de horários preestabelecidos. Vou dar um exemplo pedagógico: na sexta-feira última a manchetíssima versou sobre novos investimentos de Mauá em Segurança Pública, com a instalação de mais câmeras em áreas estratégicas. Em nome de uma regionalidade explicativa sobre o tamanho da encrenca da criminalidade o ideal seria que a reportagem recolhesse informações das demais cidades, inclusive em termos comparativos, e que incluísse dados da Secretaria de Segurança Pública do Estado sobre práticas criminais. Aí estaria encaminhada matéria de maior peso. Fosse o Grande ABC apenas uma cidade, com apenas um secretário para cada área específica, como, por exemplo, é São Paulo, a cobertura seria menos trabalhosa.   

Mais ombudsman   

 Embora tenha de levar a territorialidade dividida e multifacetada da região em conta, a observância do produto que recebo todos os dias em meu domicílio não pode prescindir do olhar de assinante, de leitor, porque é esse olhar com que todos igualmente contemplados todas as manhãs medem a qualidade do jornal. Provavelmente com menos conhecimento técnico, mas com abundância de sensibilidade. Justificando a restrição ao esquecimento das históricas declarações de Lula da Silva na Primeira Página, sobretudo como manchetíssima, tudo seria resolvido com pequena força-tarefa. O que fariam profissionais para transformar em regionalidade as informações que os jornais deram em destaque? Simplesmente adaptar o conteúdo, agregando fatos históricos sobre o surgimento do PT na região, embora seus líderes de então tenham preferido um colégio da Capital como local de batismo. Gostemos ou não – e isso fica a critério de cada um – Lula da Silva e seus seguidores, inclusive os sindicalistas da CUT (Central Única dos Trabalhadores) que partidarizaram o movimento que deveria estar limitado à esfera econômica, são frutos da região. Somos, portanto, a manjedoura desses irmãos siameses.  

A outra coluna   

O outro exemplo de que a função de ombudsman que exprimia na coluna “Contexto” do Diário do Grande ABC jamais poderia ser confundida com a atividade de relações públicas segue abaixo. Mexi num vespeiro que segue ativo até estes dias. E não dão sinais de mudança.

Jornalismo Luluzinho  

consagra sindicalismo   

 Daniel Lima -- 08/08/2015 

Seria baita estupidez afirmar que o sindicalismo utiliza arsenal de marketing como focinheira nos veículos de comunicação – jornais impressos como este Diário, por exemplo. Focinheira pressupõe algo perigosamente reativo e este Diário, como todos os demais diários impressos e digitais, está a léguas de distância do sentido rottiwaileriano desejado à atividade. É mais apropriado afirmar que os jornais, inclusive este Diário, são luluzinhos, raça que serve mais como decoração, como enfeite, do que como segurança providencial. O PPE (Programa de Proteção ao Emprego) é a prova viva do estado moribundo do jornalismo sequestrado por declarações que consagram sindicalistas de todos os naipes. Principalmente, no caso do Grande ABC, do Sindicato dos Metalúrgicos do ABC, comandado por dinastia afinadíssima que começou com Lula da Silva no final dos anos 1970.  

Mais ombudsman   

 Duvido que não tenha saído exclusivamente do forno marquetológico do Sindicato dos Metalúrgicos do ABC a notícia sobre o primeiro acordo na região para a consumação do PPE, que contemplará a autopeças Rassini Automotive, de São Bernardo. A assessoria de imprensa do sindicato deve ter trabalhado um bocado. Praticamente em todas as modalidades de mídia as reportagens seguiram o mesmo padrão informativo. Apenas este jornal tomou cuidado de ouvir outros personagens. E o fez de forma relatorial.  

Mais ombudsman  

 Tão relatorial que desprezou uma senda importantíssima. Trata-se do seguinte: o titular da unidade do Ciesp (Centro das Indústrias de São Paulo) em Santo André, Emanuel Teixeira, deixou nas entrelinhas um recado inquietante que talvez explique a relutância, entre muitas razões, de empresários adotarem o PPE, por mais que a situação econômica seja crítica. O entrevistado disse o seguinte, referindo-se à condicionalidade de as companhias que quiserem fazer a redução de jornada com diminuição de salários terem de provar ao governo que estão em situação financeira difícil: “É colocar o sindicato como gestor desse processo”.   

Mais ombudsman   

 Se não disse com todas as letras, Emanuel Teixeira afirmou o suficiente para o seguinte entendimento: os sindicatos que não prestam contas financeiras a ninguém, protegidos por legislação marota, podem deitar e rolar ao mergulharem nas numeralhas das empresas. Ou seja: os sindicalistas passam a contar com todo o inventário econômico e financeiro das companhias para fazerem uso como e quando bem entenderem. Quem quer dividir os segredos de uma empresa com sindicalistas numa operação supostamente benéfica a ambas as partes, mas com potencial de bumerangue na virada de esquina de um futuro qualquer?   

Mais ombudsman   

 É claro que não foi apenas essa espécie de bomba relógio o aspecto que caracteriza o jornalismo de Luluzinho da mídia em geral no relacionamento com sindicalistas. Não é de hoje que os repórteres são presas fáceis de uma doutrinação muitas vezes equivocada em nome de suposta representação dos trabalhadores. No caso específico do PPE, está mais que na cara que o Sindicato dos Metalúrgicos do ABC, de onde partiu a ideia do projeto, quer mesmo é amenizar a crise político-partidária que abala o PT, agremiação à qual está vinculado com a intermediação da CUT (Central Única dos Trabalhadores).  

Mais ombudsman  

 Inspirado em políticas de relações trabalhistas da Alemanha, o PPE é um engodo porque transmite a sensação de que resolverá os problemas do Grande ABC, ou mesmo os amenizará, quando, de fato, vai ser apenas um esparadrapo. Nosso drama é estrutural, de Custo ABC, e tem no sindicalismo com um dos principais vértices às resoluções necessárias. Um sindicalismo que teima em desprezar conceitos de produtividade e que, por isso mesmo, perde o jogo da competição no próprio território nacional.  

Mais ombudsman   

 Os 550 trabalhadores da Rassini que vão trabalhar 15% menos e vão perder 7,5% dos vencimentos são um grão de areia (0,22%) ante os mais de 247 mil operários do setor industrial com carteira assinada na região. A projeção do governo federal, de que o Programa de Proteção ao Emprego deverá contemplar até 50 mil trabalhadores, não fica atrás como atomização da medida diante de quase 10 milhões de carteiras assinadas na atividade no País.  

Mais ombudsman  

 O que os jornalistas de diários de todos os cantos do Brasil ainda não perceberam – e isso vem desde longe – é que os sindicalistas de setores mais politicamente engajados fazem de cada um deles gato e sapato com uma artilharia pesada de proselitismo econômico-social que não passaria por rigores que contemplem análise crítica independente. Como o peso relativo da atividade industrial sob a influência do conglomerado CUT-PT na região é considerável e, principalmente, como o estado de condicionamento técnico e operacional da massa de indústrias da região está aquém, muito aquém, dos níveis nacionais e internacionais mais resilientes à concorrência, a cobertura sindical deste Diário é de permissividade acachapante. Nenhuma solução dos problemas industriais enraizados na região será alcançada sem o desmonte do conservadorismo sindical que, em suma, age como espantalho a novos investimentos no setor. 



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