Sei bem como funciona o mercado de compra e de venda de sentenças. Vivi muito nesse mundo de compras e vendas de sentenças. E ainda vivo. Não posso, portanto, fingir-me de morto quando se toca no assunto. Tenho provas testemunhais e documentais de que se compram e se vendem sentenças sem a menor cerimônia.
Há sempre pessoas e grupos de pessoas, quando não muitas e muitas pessoas, interessadas no assunto. Não sei se a torcida do Corinthians conhece esse negócio, se a do Palmeiras também, se juízes e promotores idem, se bandidos e mocinhos também. Só sei que sei e posso relatar muitos fatos documentados e testemunhados sobre sentenças que se compram e sentenças que se vendem.
Sei que vão dizer que estou a blefar, que sou um jornalista irresponsável ou louco ao afirmar e reafirmar que sentenças são compradas e vendidas ao sabor dos acontecimentos que assim o recomendam, quando não o exigem. Deixem que digam, que falem, que se estrebuchem. Ninguém vai me proibir de dizer o que tenho a dizer para esclarecer ao distinto público sobre compra e venda de sentenças.
Sei de gente que treme quando se fala em compra ou venda de sentença. Ou principalmente quando tentativas de compras dão com os burros nágua tanto quanto tentativas de vendas. Sim, porque é preciso explicar explicadinho que nem sempre uma sentença que está à venda é uma sentença que se compra. E que também nem sempre uma sentença que se compra foi necessariamente colocada à venda. A oferta e a demanda dependem das circunstâncias. Muitas vezes nem é preciso haver oferta, porque a demanda é compulsória. E outras vezes a demanda é que dita o ritmo da chuva de negociações.
Simplicidade e embaraço
Conheço gente que só de ouvir falar em compra ou em venda de sentença fica toda ruborizada. Se insistem no assunto, então, é possível que tenha síncope. Não se deve falar simplesmente em compra e venda de sentença, porque poderia sugerir embaraço. Compra e venda de sentença não é uma receita médica que dispensa arredondamentos explicativos.
Quem pronuncia inadvertidamente alguma frase equivalente à compra ou venda de sentença (“Quanto custa esta sentença”; ou “Quanto pago por esta sentença”) pode dar com os burros da precipitação nágua.
Poucos interlocutores não entram em parafuso à pergunta simples e objetiva de quanto vale uma sentença. Não, não e não, esse não é um assunto para ser tratado assim a céu aberto, escritório aberto, reunião aberta, celulares a postos, smartphones atentos.
Cada vez mais há quem prefira tratar de compra ou venda de sentença em ambiente barulhento, preferencialmente bastante barulhento, e notavelmente na penumbra.
Mais que isso: se houver companhias femininas insuspeitas, então, melhor ainda. Mulheres insuspeitas são mulheres que não são próximas dos interlocutores. Podem até se tornarem íntimas depois, mas nesse caso a intimidade é profissional. Companhias femininas insuspeitas para valer mesmo somente se encontram nos puteiros, com perdão do verbete. O sigilo da fonte é um ofício que mulheres ocasionais exercitam com lealdade. Bem diferente de tantas outras mulheres, não é verdade?
Sem riscos de vazamento
A expressão zona do meretrício já saiu da moda faz tempo. Por isso prefiro puteiro. Puteiro é um lugar interessante para estimular o cérebro e outros órgãos mais votados pelas mulheres e, haja Viagra, nem sempre em ponto de bala nos homens. Puteiro é sempre um local impenetrável a escutas esclarecedoras.
Dizem os especialistas em compra e em venda de sentenças que as mulheres da noite não estão nem aí com o dia a dia dos executivos a que servem. Querem mesmo tomar-lhes o que têm de melhor. E o que têm de melhor não está numa assinatura qualquer, num encaminhamento de negócio qualquer e tampouco naquilo que os homens idiotas como sempre pensam que está entre as pernas, além do joelho, naturalmente.
Sentenças compráveis ou sentenças vendíveis são boas de verdade quando não deixam brechas a subjetividades. É preto no branco e estamos acabados. Há, entretanto, correntes defensoras da aplicação de hermenêutica em qualquer situação favorável a sentenças genéricas, que não definam um alvo específico, mas que cumpram a missão de resolver o problema demandado.
Acho engraçado que entre uma solução e outra exista tamanho buraco interpretativo. Ou seja: a objetividade nem sempre é melhor que a transversalidade de interpretação.
Sentenças que se compram e sentenças que se vendem em ambientes insuspeitos são as melhores sentenças do mundo, garantem os especialistas. Bebidas alcoólicas, cigarros, música estourando os ouvidos, mulheres ousadas, empurrões involuntários, cutucões propositais, tudo isso age como uma fornalha à imaginação e à criatividade.
Despertando criatividade
Mentes mais brilhantes brilham ainda mais estimuladas pelo frenesi noturno. Garante-se que nada se compara a sentenças que emulam e crescem nesses ambientes esfumaçados. Sem contar, sempre é bom repetir, que não há risco algum de contrariedade na próxima esquina.
Quando digo e reafirmo que conheço bem esse negocio de sentenças compradas e sentenças vendidas não estou blefando. Faz parte do meu metiê escarafunchar os caminhos que levam interlocutores muitas vezes pouco próximos a encontrarem uma saída para juntar os pauzinhos de suas especialidades. É indispensável muita interação entre eles. Não há sentença comprável ou sentença vendível que deixe de passar pelo corredor da credibilidade como ponto de honra à empreitada.
Ninguém vai comprar ou vender uma sentença sem ter absoluta certeza, certeza absoluta, de que não está fazendo uma senhora burrada. Comprar gato por lebre seria uma idiotice completa. O tiro sairia pela culatra.
Quem diz que vende sentença, mas quando abordado sobre a veracidade da disposição em negociar rói a corda e coloca o outro lado do balcão em situação desagradável não é digno de um negócio preliminarmente tratado como absolutamente consensual.
Quem tem reputação na arte de comprar sentença é do ramo de comprar sentença e está acabado. Se o outro lado, o lado da venda de sentença, foge da raia, coloca tudo a perder. Abala o mercado de compra e de venda de sentenças.
Nada de radicalização
Tudo isso é muito interessante, mas não estou convencido de que o método de sentenças compradas e sentenças vendidas funcione apenas nos ambientes pouco transparentes e regados a cigarro, cerveja e putaria. Para mim, também é possível comprar e vender sentenças em locais discretos, no escritório, em casa, no banheiro. Basta que se tomem todos os cuidados para que os pretensos infiltrados não encontrem espaço.
Sempre digo aos empresários e às agências de publicidade que a aproximação entre eles para decidir o destino de uma campanha promocional não pode ser algo fortuito, apressado, de diagnóstico insustentável.
Para atingir a meta de compra e venda de sentenças que coloquem produtos, serviços e ideias num patamar diferenciado as partes precisam entender que a relação precisa ser mágica entre a frase escolhida e o objetivo a ser alcançado. A sentença vendida precisa expressar o conjunto de valores que envolvem a companha publicitária e de marketing.
Quem se meter a besta como vendedor de sentenças publicitárias ou de marketing sem se dar conta de que o comprador deve ser ouvido com o máximo de atenção vai ficar a ver navios. Não há campanha do que quer que seja que resista a um vendedor de sentença sem vocação para compactar conceitos e objetivos e a um comprador de sentença que resista a expor na mesa de negociações o máximo de informações sobre o que realmente pretende ver vendido. Só mesmo assim o vendedor de sentença chegará ao ponto máximo de atrair o público-alvo. Seja quem for.
Não é verdade, grandioso Washington Olivetto? Ou alguém duvida de uma das sentenças mais fantásticas da publicidade brasileira – “O primeiro sutiã a gente nunca esquece”. E quem não se apegou loucamente à peça publicitária de Nizan Guanaes? Qual? “Pergunta no Posto Ipiranga”.
Já como jornalista, cansei e ainda canso de explorar sentenças a serem compradas e sentenças a serem vendidas na captação de leitores que valem a pena. Por exemplo? O título desta matéria. E todos os títulos que faço todos os dias. São sentenças exploradas à compra de audiência de qualidade. Os bandidos sociais detestam.
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21/01/2025 PAULINHO, PAULINHO, ESQUEÇA ESSE LIVRO!