Faço uma aposta com quem quiser, principalmente com o prefeito Paulinho Serra, de Santo André. Uma aposta que vale o que ele bem entender, menos vestir a camisa do seu time de coração (não uso nem do meu time de paixão) ou praticar à luz do sol atos que não pratico nem em lugares mais reservados.
A aposta é simples: quero que o prefeito marque um encontro com o promotor de Habitação responsável por uma das obras mais obscuras do mercado imobiliário de Santo André nos últimos anos. Mais que isso: que me carregue a tiracolo.
Mais ainda: quero que seja transparentemente provado que não houve irregularidades na aprovação e na execução do empreendimento.
Ou seja: não se trataria de uma visita de cortesia, diplomática, nada disso. Não sou profissional de bons modos quando o assunto é efervescente. Bons modos sempre levam a ajeitamentos. Fosse diferente, a força-tarefa da Lava Jata seria integrada por religiosos.
Será que o prefeito tucano topará a sugestão e, segundo terceiros bem informados, enfrentará mandachuvas e mandachuvinhas que estariam por trás de eventuais trambicagens daquele empreendimento?
Advogado na comitiva
Vou mais longe: o prefeito tucano tem direito a levar um assessor de especialidade que bem entender (tomara que seja da área ambiental) enquanto também poderei carregar comigo um convidado – provavelmente o advogado Alexandre Marques Frias. Uma comitiva interessante que deve ser previamente informada ao promotor habitacional de Santo André, Fábio Franchi. Ele está com esse suposto abacaxi faz muito tempo e não me tem respondido à consulta que pretendo fazer. Transparência não parece ser algo a enaltecer no promotor Fábio Franchi.
Mantenho boas relações com o prefeito de Santo André. Já foram melhores, é bom dizer. Antes que se elegesse prefeito ele era mais próximo do que agora, embora jamais tenha sido infringido o distanciamento regulamentar entre jornalista e homem público.
Paulinho Serra não suporta críticas. Tem todo o direito de espernear, mas como me deve respostas a uma das questões que abordamos recentemente neste espaço, espero que tome providências a esclarecimentos que a sociedade cobra.
Aliás, a pendência tem tudo a ver com o mercado imobiliário, possível beneficiário de mudanças administrativas que transferem poderes legais do Semasa para uma nova secretaria dirigida por um ex-vereador. Quando me refiro ao mercado imobiliário concentro baterias nos grandões da região e nos grandões da Capital que aqui ancoram muitas vezes contando com parcerias locais. Os pequenos construtores são sempre vítimas desses arranjos.
Será que topa?
Quanto ao enveredar pelo empreendimento imobiliário, não existe mesmo alternativa. Ou o prefeito topa e corre todos os riscos inerentes às parcerias que o colocaram no principal cargo Executivo de Santo André, ou confessa que tem limites de gestão que passam necessariamente pela aprovação desses mesmos parceiros. Parceiros que costumam condicionar determinadas decisões a reciprocidades.
O empreendimento imobiliário em questão é o Royal Nobre Residence, condomínio de classe média construído ao lado do Shopping ABC. Como já escrevi antes, o empreendimento constava da longa lista de irregularidades e tramoias do escândalo do Semasa, ainda longe de ser devidamente punido.
Qual é o principal problema que teria marcado aquele negócio imobiliário de 640 apartamentos? No terreno que sediou durante décadas a Casa Publicadora Brasileira havia um córrego. A legislação exige 30 metros de preservação de cada margem. Esse recuo foi completamente subvertido. A cobertura física do córrego que cortava o terreno chutou a escanteio todas as normas ambientais.
A vizinhança mais antiga do Jardim Bela Vista é testemunha coletiva de que a nascente de água não era uma miragem. E o concreto armado que a engolfou também não. Tanto que está lá, impávido. Escrevi exatamente nestes termos uma matéria publicada nesta revista digital há quase um ano. Em seguida, a enderecei ao promotor da Habitação de Santo André, Fábio Franchi.
Bandalheira confirmada
O até outro dia superintendente do Semasa, entidade-xerife de água, esgoto e do meio ambiente de Santo André, Nei Vaz, me informou pessoalmente, sem solicitar sigilo da fonte, que as irregularidades são evidentes. Não só ali em de Santo André, mas especificamente ali, já que era disso que tratávamos.
A legislação federal foi surrupiada, segundo Nei Vaz. Cassaram o mandato ambiental do córrego em nome de um mercantilista que só confirmaria o desdém com que os barões do mercado imobiliário da Região Metropolitana de São Paulo atuam.
Sabe-se que se pretendeu minimizar o escândalo daquele empreendimento cujas torres remetem a ícones franceses. A inspiração às denominações, segundo outra fonte, se deve aos festejos do grupo que viabilizou o negócio em tratativas na Prefeitura de Santo André durante a gestão de Aidan Ravin. O mesmo Aidan Ravin denunciado pelo Ministério Público Estadual de Santo André no caso do Semasa -- juntamente com mais de uma dezena de servidores públicos e alguns piratas e, acreditem, absolutamente nenhum empresário fraudador. Algo como uma Lava Jato sem o outro lado do balcão.
Um chamado TAC (Termo de Ajuste de Conduta) ficou vinculado exclusivamente ao campo da mobilidade urbana, no entorno do empreendimento. Um quebra-galho. Mesmo nestes tempos de recessão econômica o inferno mora naquela área em forma de centenas de veículos dos residentes no condomínio que se somam aos frequentadores do Shopping ABC.
Crime esquecido
O crime ambiental propriamente dito, mencionado pelas fontes oficiosas e oficiais, foi simplesmente esquecido. É sobre isso -- também e principalmente -- que pretendo conversar com o promotor Fábio Franchi. E agora, como se verifica, pretendo contar com o apoio do prefeito de Santo André.
Quem acha que este jornalista está sendo incoerente ao suscitar esse tipo de abordagem depois de haver escrito recentemente que não pretendia mais se meter em assuntos nebulosos, que envolvam Justiça e Ministério Público, está enganado. Novos escândalos não passam pela minha cabeça, mas os antigos, não podem cair no esquecimento.
Não afirmo categoricamente que o Royale Residence é mais um ramal da bandalheira imobiliária na região a salvo de apuração, mas como o promotor Fábio Franchi fechou-se em copas, como se o cargo que exerce não tivesse qualquer relação com o interesse público, sou obrigado a solicitar reforço.
Não que acredite que venha a contar com o reforço sugerido, mas não custa nada tentar. Entre o incômodo e o contraproducente, acho que Paulinho Serra vai fincar raízes na primeira alternativa. Tomara que me contrarie. Cópias deste material estão sendo encaminhadas a mais de meia centena de promotores públicos da Província do Grande ABC. Transparência redundante é melhor que obscuridades alarmantes.
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21/01/2025 PAULINHO, PAULINHO, ESQUEÇA ESSE LIVRO!