Em 19 de março do ano passado, quando o vírus chinês (geograficamente, é bom que se diga, porque não faltam milicianos ideológicos na praça) causava os primeiros estragos no Grande ABC e no País como um todo, produzi um texto que remetia, com base cientifica, a 17 mil mortes no território regional. O título (“Coronavírus provocaria mesmo 17 mil mortes no Grande ABC?”) era desprovido de credibilidade do executor, mas se baseava em estudo ao que parece premonitório, respaldado pela ciência.
Não passava pela minha cabeça algo sequer próximo a isso. E ainda resisto a imaginar que chegaremos àquilo. Uma resistência com jeito de politicamente correta. Já nos aproximamos de 10 mil cadáveres. E são tantas as variantes da Covid que é impossível garantir fim próximo.
Brinco sério com o vírus ao fazer troça da própria desgraça. Zombo ao lembrar que estou covidado (isso mesmo, covidado é corruptela de Covid), duplamente vacinado e, antes disso, baleado. É claro que tudo isso tem o sentido de exorcizar emocionalmente uma desgraça individual e também uma desgraça coletiva que já colheu vários familiares e amigos.
Bruno Daniel de mortos
Contar com o equivalente a um Estádio Bruno Daniel de cadáveres (justamente o Bruno Daniel dilacerado por um hospital de campanha até prova em contrário desnecessário ou então desativado precocemente) é um terror. Ainda mais que estamos forçando a barra de ocupação das arquibancadas.
No fundo, seria mais que um Bruno Daniel. A capacidade do estádio foi reduzida pela Federação Paulista de Futebol por imposição de normas de segurança. Já se foi o tempo em que era possível colocar até 20 mil torcedores, recorde num jogo do Ramalhão contra o Corinthians. Hoje são 12 mil, 15 mil no máximo.
Quando escrevi sobre aquela projeção de 17 mil mortes, estava isolado numa cidade do Interior do Estado. Decidira fugir do vírus que atacava principalmente a Região Metropolitana de São Paulo. Peguei minhas cachorras, aparelhei-me tecnologicamente e transferi meu escritório domiciliar àquele bucólico condomínio residencial. Foram 30 dias raros na minha vida, desde que me mudei de Araçatuba para Santo André, aos 17 anos de idade. Raros no sentido de que me isolei em outros ares. E devo confessar que, ao retornar, passando pela Via Anchieta, chorei de emoção. Emoção de voltar. Sou um chorão que ama viver.
Baixa competência
Mas, voltando ao que interessa, o que está mais que na cara é que não tivemos competência regional para lidar com o vírus chinês. Não é exigência desmesurada essa constatação. O viés crítico de inapetência do coletivismo do Clube dos Prefeitos é indispensável como metodologia corretiva. Contamos com uma torcida organizada da mídia. Quem desconhece a realidade da pandemia no Grande ABC e se baseia apenas no noticiário local é levado a concluir que cada um dos atuais prefeitos (e os que foram apeados do cargo nas eleições do ano passado), merece premiação especial.
Os dados estatísticos são cruéis e nada indica que alguém possa afirmar categoricamente que aquelas 17 mil vidas perdidas previstas em março do ano passado teriam sido uma barrigada estatística de especialistas que ganhou espaço nesta revista digital.
A progressão de letalidade do Coronavírus no Grande ABC e no País como um todo é conhecida pela agressividade. Daí chegar à conclusão de 17 mil mortes não é uma projeção irresponsável.
Agressividade do vírus
Terminamos o ano passado com 3.549 casos letais do vírus no Grande ABC, ante 46.717 no Estado de São Paulo e 194.976 mil no Brasil. Ainda está longe de fechar o primeiro semestre e contamos com 9.707 mortes no Grande ABC, 130.935 no Estado e 528.611 no Brasil. O aumento de 173,51% de casos letais na região (contra 180,27% no Estado e 171,11 no País, é revelador do estágio da pandemia.
O Grande ABC adicionou nesta temporada 6.158 mortes por causa do Coronavírus. Quando terminar o semestre, chegaremos provavelmente a um acréscimo de sete mil em relação a dezembro do ano passado. Nessa toada, quando o fim do ano chegar, atingiremos aqueles 17 mil casos letais previstos em março do ano passado.
Projeção de mortes
Transcrevo o artigo do site Tecmundo, escrito por Verônica Scheifer. Utilizo todos os pontos essenciais. Leia os trechos principais daquela matéria:
O professor doutor de Astrofísica da Universidade Federal do Rio Grande do Norte e Astrônomo associado ao Harvard-Smithsonian Center for Astrophysics, José Dias do Nascimento Júnior, montou junto ao professor doutor da New Mexico State University, Wladimir Lyra, um modelo matemático em Python, que prevê desastres para o Coronavírus no Brasil, caso não sejam tomadas medidas para conter a epidemia no país. Pelo mundo, pesquisadores de todas as áreas demonstram esforços para conter e prever casos de Coronavírus para auxiliar nas decisões diante da pandemia que se alastra pela humanidade. O professor doutor José Dias do Nascimento Júnior explica que após o início do surto começou a pesquisar sobre o assunto e maneiras de contribuir e colaborar para diminuir a pandemia. “Assim que começaram a aparecer as primeiras reações globais, comecei a me perguntar sobre as hipóteses dos modelos utilizados no estudo da propagação do vírus. Quais equações seriam válidas e sob quais aspectos. O novo surto de mostrava que iria fazer história e eu já sabia de outras pesquisas, das limitações de algumas condições matemáticas utilizadas nos modelos. Foi aí que encontro Wladimir Lyra em conversas da rede social”, conta Nascimento.
Mais projeção de mortes
O professor doutor Wladimir Lyra afirma que a ideia de ambos se complementam e partir disso, as hipóteses evoluíram em um modelo para matematizar os casos de Coronavírus já existentes e novos. “A ideia e o motivo da pesquisa são devidos à presente pandemia do Coronavírus, para compreender a dinâmica da propagação da infecção. Pela leitura de artigos científicos na área de epidemiologia matemática, me deparei com o modelo SIR, que foi o primeiro a buscar matematizar uma epidemia”, destaca Lyra. O professor explica que percebeu que as equações eram muito parecidas com as que estuda diariamente e por isso havia meios para resolvê-las e assim agregar conhecimento ao campo de estudo do corona. “Não é nada que já não tenha sido feito no campo de epidemiologia, foi um projeto para eu aprender sobre o assunto”, apresenta Lyra.
Mais projeção de mortes
Diante do caos da pandemia, Lyra explica que o estudo dele e de Nascimento, matematiza a dinâmica da propagação de uma infecção e pode auxiliar no combate da mesma. O trabalho considera que a população do país seja dividida em quatro categorias: suscetível, infectada, curada e mortos. Essas categorias interagem segundo regras pré-estabelecidas: a) Quando infectados e suscetíveis interagem, uma parcela é removida da categoria suscetíveis e colocada na categoria infectada; b) Parte dos infectados se curam em um dado intervalo de tempo. Esses são removidos da categoria infectados e colocados na categoria curados; c) Outra parte dos infectados morrem devido à doença. Esses são removidos da categoria infectados e colocados na categoria mortos); d) Os curados desenvolvem imunidade e, portanto, não são colocados de volta na categoria suscetível.
Mais projeção de mortes
A última regra significa que curados e mortos também podem ser acrescentados juntos na mesma categoria, de “removidos” da pandemia. Isso resulta no nome ao modelo, SIR (Suscetíveis-Infectados-Removidos). Essas regras são matematizadas e as equações resolvidas para revelar a evolução da epidemia. Por exemplo, na regra A, a quantidade removida é proporcional ao número de pessoas infectadas e ao número de pessoas suscetíveis. A base de dados utilizada na pesquisa dos cientistas foi mantida e atualizada pelo Centro de Ciências de Sistemas e Engenharia (CSSE, em inglês) da Universidade de Johns Hopkins. Os dados são divididos em casos de infecção, remissão e fatalidades. A base de dados é atualizada frequentemente e contém detalhes como datas e distribuição geográfica.
Mais projeção de mortes
A partir desses parâmetros foram calculadas as taxas que entraram no modelo. Os componentes do modelo aplicados à epidemia do Coronavírus resultam em um contágio muito rápido. Os dados da Itália mostram que uma pessoa infectada passa o vírus para, em média, entre 3 e 4 pessoas antes de se curar ou morrer pela infecção e com isso o número de casos dobra a cada 4 dias. Lyra explica que há apenas duas maneiras de finalizar essa epidemia. “A primeira é quando muitas pessoas foram infectadas e desenvolveram imunidade ao se curar. Quando isso acontece não há mais pessoas suscetíveis e, portanto, segundo a regra (A) do modelo, não há novas infecções possíveis. Obviamente esse caso é terrível, foi praticamente toda a população infectada em algum momento durante a epidemia e o número de mortos pode ser assustador”, alerta Lyra.
Mais projeção de mortes
O professor doutor resume que “a segunda maneira de terminar a epidemia é quando a taxa de infecção é menor que a taxa de remissão e então a epidemia é contida. A quarentena (ou vacina) funciona por diminuir a taxa de infecção. O tratamento funciona para aumentar a taxa de remissão. Sem tratamento ou vacina, temos apenas a quarentena como medida eficaz.”. A base de dados do CSSE consultada pelos cientistas durante a pesquisa apresenta informações de todos os países atingidos pela epidemia. Os principais utilizados no modelo foram: China, Coreia do Sul, Itália, Suécia, Estados Unidos e o Brasil. O modelo alerta para até 2 milhões de mortes no Brasil no pior cenário previsto.
Mais projeção de mortes
O modelo dos pesquisadores quando aplicado ao estado de epidemia no Brasil resulta que cada pessoa infectada está, em média, infectando 6 pessoas. A partir dessa taxa, o número de casos dobra entre 2 e 3 dias. Lyra anuncia que “se continuar desta maneira, sem fazermos nada, a epidemia terá seu pico daqui a 50 dias, no começo de maio, com 53% da população infectada ao mesmo tempo. Isso são mais de 100 milhões de casos. Os hospitais não têm capacidade de lidar com esse número. E, ao final da epidemia, teríamos 2 milhões de mortos.” O modelo apresentado pelos pesquisadores gerou dois gráficos que resultam na quantidade de mortos no Brasil nos próximos meses e evidenciam um resultado assustador para a população brasileira. Esse pior cenário representa a condição em que as restrições sociais não são seguidas.
Mais projeção de mortes
O modelo foi rodado no dia 16 de março de 2020 e os cientistas identificaram que a primeira morte pelo Coronavírus ocorreria nos próximos cinco dias. “Ontem (dia 16 de março), uma previsão do modelo foi que a primeira morte no Brasil ocorreria em algum momento nos próximos cinco dias. Quando acordei de manhã no dia 17 e fui ler as notícias, tínhamos o primeiro caso fatal”, confirmou Lyra. Os cientistas alertam que se não foram tomadas medidas de prevenção e a população não praticar o distanciamento social, os resultados do modelo irão se concretizar. “Sem tratamento ou vacina, a única forma desta epidemia parar naturalmente é ela correr seu curso, infectando centenas de milhões, e matando milhões de pessoas. O modelo prevê dois milhões de mortos no Brasil se não fizermos nada. Para evitar isso a população tem que parar de sair de casa, praticar distanciamento social. Apenas isso vai evitar o contágio”, argumenta Lyra.
Mais projeção de mortes
Os pesquisadores destacam a importância de todas as áreas olharem para a pandemia e realizarem esforços para criar maneiras e caminhos que evitem ou até mesmo ajudem o mundo a conter os casos. “Devo dizer que eu não sou epidemiólogo, sou astrônomo e astrofísico, especializado em matemática aplicada e modelos computacionais. Comecei esse projeto ao ler sobre modelos matemáticos de evolução de epidemias e ver que as equações eram bem parecidas com outras equações com que trabalho todo dia. Tinha, portanto, as ferramentas para resolvê-las em um modelo simplificado”, alega Lyra.
Mais projeção de mortes
O professor doutor, José Dias do Nascimento Júnior, demonstra que no momento atual da população a ciência é globalizada e qualquer parâmetro científico não pode ser tratado como algo simples e excluído no momento tomada de decisão para conter a epidemia. “Estamos passando por um período cíclico de problemas. Isso vai do aquecimento Global, as grandes epidemias. Estamos hoje fazendo uma ciência globalizada, onde parâmetros não podem ser tratados como sistemas simples. O próprio planeta que vivemos e sua população humana é completamente conectado em um grande sistema complexo”, afirma Nascimento.
Mais projeção de mortes
As epidemias foram encontradas em diversos momentos da humanidade, mas segundo o professor doutor, ainda não há um modelo físico completo e totalmente eficiente para ajudar na tomada de decisão de maneira rápida e eficaz. “Durante nossa história, encontramos repetidamente grandes epidemias como a Peste (Peste Negra) no século 14, a Gripe Espanhola em 1918 e mais recentemente a Gripe Suína (2009). Apesar de todas essas epidemias afetarem severamente a população global, ainda não temos um modelo físico eficiente que nos ajude a tomar decisões certas em pequeno espaço de tempo”, confirma Nascimento.
Mais projeção de mortes
Conforme Nascimento, os estudos analíticos de dados podem auxiliar em aspectos diante de uma doença que se alastra rapidamente pelo mundo. As previsões a partir de equações podem gerar decisões que irão melhorar as maneiras de lidar com o problema enfrentado. “As abordagens analíticas para estudar e modelar a natureza sistêmica da disseminação de uma doença infecciosa é um belo exemplo de como a ciência opera (modelo SIR). E partir das previsões feitas com um punhado de equações simples, percebe-se o poder da ciência em revelar comportamos futuros”, enfatiza Nascimento.
Mais projeção de mortes
O professor doutor ainda pondera para a importância de políticas que incentivem a ciência para realizar o trabalho em momentos como o da pandemia do novo Coronavírus. “Sem dúvida acredito que trabalhos como esse devem ser parte dos esforços colocados nas políticas de saúde pública. Apesar de muitas questões terem sido respondidas, muitas outras permanecem em aberto, porém a ciência é sempre a bússola necessária para a proteção nestes casos”, anuncia Nascimento. Os resultados que os cientistas encontraram compõem um artigo científico que será submetido para revista científica na área da Física.
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21/01/2025 PAULINHO, PAULINHO, ESQUEÇA ESSE LIVRO!