Sociedade

Quando o coração
bate mais forte

VANILDA DE OLIVEIRA - 05/08/2001

As 24 horas do dia são insuficientes para o vigor profissional do cardiologista Antonio Carlos Palandri Chagas. Nascido em São Caetano há 48 anos e formado na Faculdade de Medicina do ABC, ele ganhou o mundo para especializar-se na paixão pela cardiologia. São mais de 20 anos ligado no coração dos outros, dedicação que quase lhe tira tempo de dar atenção aos próprios batimentos cardíacos. Nada, porém, que tenha a ver com a correria obsessiva de workholics (loucos por trabalho) atrás só de fama e dinheiro. 

Antonio Palandri Chagas é homem de sorte, porque faz bem o que gosta e ainda ganha para isso. Mais: aprende todos os dias ao ensinar tudo que sabe e mesmo assim não se satisfaz com a sabedoria acumulada desde que entrou para a universidade, fez mestrado e dois doutorados no Brasil e Exterior. Não bastasse já se dividir entre a clínica em São Caetano, o atendimento no Instituto do Coração, as aulas na Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo e a mulher e três filhos adolescentes, esse descendente de espanhóis e portugueses radicados no C do Grande ABC encontrou tempo para nova tarefa: presidir a Socesp (Sociedade de Cardiologia do Estado de São Paulo), para a qual foi eleito em junho último.

Nem tempo e nem mesmo o trânsito que enfrenta diariamente para chegar ao Incor são problemas para o cardiologista de São Caetano. "Coloco um CD de música clássica no carro e ignoro os congestionamentos" -- ensina Antonio Palandri Chagas, que se recusa a usar a Avenida dos Estados como caminho para o Instituto do Coração. Prefere a Aclimação, rota mais tranquila. O coração agradece, porque o cardiologista não se estressa com tantas tarefas e consegue isso graças à troca e constante reciclagem que as aulas e orientação a alunos pesquisadores lhe garantem no dia-a-dia. Tudo que sabe ensina e essa doação tem retorno mais que positivo: volta para Antonio Palandri na forma de novos conhecimentos, que são aplicados em benefício dos milhares de pacientes. Forma-se, assim, ciclo virtuoso de ensinamento, aprendizado e prática, que alimenta coração e mente do cardiologista. 

No Incor, Antonio Carlos Palandri Chagas faz parte do núcleo de pesquisa em arteriosclerose, no qual trabalha com alunos em graduação e pós-graduação. "Gosto de estar sempre estudando, de descobrir e acompanhar de perto os avanços da Medicina, de ensinar no Incor e colocar em prática no consultório. Uma atividade complementa a outra nesse ciclo de aprendizagem e ensinamento" -- conceitua o clínico e professor ao resumir que adora mesclar o meio científico e prático.

A história de sucesso profissional de Antonio Carlos Palandri Chagas começa no final dos anos 70. Depois de se formar na Faculdade de Medicina do ABC, fez residência na Escola Paulista de Medicina e no Incor. Já casado com a pedagoga Jusite e pai do primeiro filho, João Paulo, hoje com 18 anos, o cardiologista fez as malas e rumou em 1984 para o início de sua história de amor com os estudos e pesquisas em cardiologia, nos Estados Unidos, onde morou durante três anos. Antonio Palandri mergulhou nos livros. "Foi um período muito interessante da minha vida, que se tornou espartana, no qual pude me aperfeiçoar e conviver com especialistas importantes, além de desenvolver o aprendizado da metodologia de pesquisa científica" -- lembra o cardiologista, que à época tinha bolsas de estudo do CNPq (Conselho Nacional de Pesquisas) e de uma fundação norte-americana.

Antonio Carlos Palandri Chagas optou pela cardiologia clínica por considerar muito importante o trabalho preventivo de doenças. Para ele, prevenção ainda é um desafio no Brasil. "Embora o País tenha evoluído, a maioria ignora a importância de se submeter a exames periódicos do coração. O brasileiro só costuma ir ao médico quando já está doente" -- analisa. É um grande risco, já que pesquisas comprovam que entre 70% e 80% das arritmias cardíacas e dos infartos agudos do miocárdio podem ser diagnosticados com um simples eletrocardiograma. 

Doenças cardiovasculares são responsáveis por 15 milhões de mortes por ano no mundo atualmente. No Brasil, é a primeira causa de mortalidade e mata mais de 800 pessoas por dia. Até 1900, muito poucos morriam de doença cardíaca, mas desde então, os problemas do coração têm-se tornado matadores número um nos principais centros industrializados. A era da tecnologia fez com que a vida ficasse mais fácil, mas tantas facilidades também contribuem para aumentar a incidência de doenças cardíacas. Antonio Carlos Palandri Chagas sabe muito bem de todos esses números, por isso lamenta a falta de procura pela medicina preventiva. "É mais barato prevenir do que tratar uma doença, principalmente para um executivo. Um infarto, por exemplo, tem custos sociais e profissionais muito grandes" -- expõe.

Madrugada -- Antonio Palandri levanta às 5h e antes de enfrentar o trânsito paulistano caminha pelo menos 20 minutos nas calçadas da Avenida Goiás. Às 8h já está no Incor para iniciar rotina de trabalho que só termina por volta das 21h. O cardiologista de São Caetano admite que trabalha sete dias por semana, porque aos sábados e domingos faz visitas aos pacientes no Instituto do Coração. 

"A rotina não me estressa nem me incomoda, apesar de me deixar sem tempo e me impedir de jogar as partidas de tênis de que tanto gosto" -- conta. O preço é baixo para quem garante ter muito, mas muito prazer em trabalhar. Um dos momentos de estresse que Antonio Palandri admite, porém, é a perda de um paciente. "Apesar de ser um profissional, é difícil acostumar com a morte" -- afirma, ao admitir que acaba virando amigo dos pacientes. "Nem sei dizer quantos são. Milhares" -- calcula o médico sobre o número de pessoas que já passaram por suas mãos. Ele gosta de contar que cuida preventivamente da saúde cardíaca de famílias inteiras e que, inclusive, já chegou a tratar três gerações do mesmo clã. 

A toda essa rotina de trabalho Antonio Palandri Chagas incorpora desde junho o cargo de presidente da Socesp, da qual era membro da diretoria havia seis anos. O médico explica que a nova tarefa o aproxima da comunidade, de fazer trabalho em prol da categoria. "À frente da Socesp quero dar continuidade à educação do médico. Tanto que já ministramos curso para mais de 200 profissionais este ano" -- explica o cardiologista, ao garantir que seu coração vai muito bem. Nos próximos dois anos, tempo do mandato, Antonio Palandri pretende ampliar em quantidade e qualidade a agenda de eventos da Socesp. "Na cardiologia, os eventos são essenciais à internacionalização dos conhecimentos e reciclagem dos profissionais porque em dois anos surgem novos procedimentos de diagnóstico. Congressos e seminários servem para atualizar o profissional" -- explica o médico de São Caetano.

Segundo Antonio Palandri, o Brasil é uma das potências em cardiologia, com instituições e profissionais respeitados no Exterior pelos avanços e conquistas na área de pesquisa.  Para se manter no nível de excelência, ele está sempre de malas prontas. Este mês, por exemplo, participa do Congresso Europeu de Cardiologia, na Suécia, com quatro trabalhos do grupo que coordena no Instituto do Coração. 

Útil e agradável -- Para se refazer de tantas atividades, Antonio Palandri aproveita outro item da lotada agenda para relaxar: as viagens. Viaja muito, a maioria das vezes, é lógico, a trabalho, para dar aulas ou participar de eventos sobre cardiologia. Mais uma vez ele revela que a profissão é também fonte de prazer, além de prestígio e reconhecimento. "A Medicina permitiu-me conquistar vários amigos, conhecer o mundo e fazer o que gosto" -- conta, ao admitir que não lembra a última vez que foi ao cinema. 

Com o pouco tempo que sobra, o passeio principal é comer em bons restaurantes, principalmente que sirvam massas e culinária francesa. É quando aproveita para estar com a família. Como adora ler, Antonio Palandri tenta não se afastar dos livros, embora ultimamente falte-lhe tempo. Ele está em dia, porém, com clássicos da língua portuguesa como Os Lusíadas (Camões) e Grande Sertões Veredas (Graciliano Ramos). Tempo para televisão, nem pensar. "Sou muito agitado" -- admite o médico, que fez teatro quando era aluno do então científico da Escola Estadual Bonifácio de Carvalho, que está para São Caetano como o Américo Brasiliense para Santo André, e também na Fundação das Artes. Tanto que espremeu a agenda e conseguiu assistir à peça Os Miseráveis, em cartaz na Capital paulista. Antonio Palandri também arruma tempo para hobby que cultiva desde os 14 anos: fotografar. Para a tarefa, tem equipamento semiprofissional e aproveita as viagens de trabalho e de lazer.



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