Se o ativo de confiança do governo Jair Bolsonaro não é lá essas coisas, embora também não seja pouca coisa, conforme inventariou o Datafolha em pesquisa realizada entre 2 a 3 de abril e desmembrada em várias edições do jornal Folha de S. Paulo, imaginem então como anda a situação pelos lados da imprensa profissional e das redes sociais?
É claro que o jornal paulistano não deu ênfase a esse vetor nas edições que se seguiram. Na de ontem, por exemplo, reservou um pé de reportagem para expor os resultados.
O jornalismo profissional e as mídias sociais não teriam possibilidade alguma em qualquer eleição majoritária se incorporassem candidaturas físicas. Bolsonaro, que não anda lá essas coisas, mas também não é pouca coisa, repito, lhes aplicaria uma surra tremenda.
Sei que podem argumentar que uma coisa é uma coisa (o ativo eleitoral de Bolsonaro) e outra coisa é outra coisa (a confiança nas notícias dos meios de comunicação tradicionais e das redes sociais), mas não há como não confrontar os resultados do Datafolha. No fundo, no fundo, acreditem, é a mesma coisa. Se não for a mesma coisa é quase a mesma coisa. E se não for quase a mesma coisa é melhor nem continuar, porque tergiversações sempre acabam negando o inegável.
Aos números, portanto
Mas vamos em frente nas comparações? A Folha de S. Paulo publicou, com o estardalhaço de manchetíssima de primeira página natural do jornalismo, que Jair Bolsonaro registrou na pesquisa deste começo de abril 32% de ótimo/bom, contra 33% de regular e 30% de ruim/péssimo. É claro que deu tom negativo aos dados, ao compará-los com o pós-eleição. Justo que assim o faça, embora as situações sejam diferentes, de expectativa de poder e de exercício do poder.
O resultado, portanto, não ultrapassa a linha da normalidade nestes tempos de polarização à direita e à esquerda e, principalmente de um país-fim-de-feira deixado pela Nova República de Ladrões.
Trata-se de um terço para cada lado e de um terço de eleitores que nem pendem para um nem pendem para um lado nem pendem para outro lado; ou seja, gente que sempre está à espreita para ocupar o barco mais confiável.
Agora vejam só os resultados obtidos pelo Datafolha ao questionar os entrevistados sobre a confiança que têm as notícias na imprensa profissional e nas redes sociais.
Preparem-se porque são números tenebrosos, embora nada surpreendentes para quem é do ramo. Cada vez mais a imprensa tradicional é exposta à luz do sol do contraditório das redes sociais. Temos, com isso, um processo retroalimentador tão elucidativo quanto confuso e destruidor, como todo contraditório embute. Vamos aos resultados?
Situação crítica
O Datafolha, segundo a Folha de S. Paulo de ontem, registrou que apenas 5% das notícias da imprensa profissional são confiáveis, enquanto 17% acham a maioria das notícias não confiáveis e 61% registram que apenas algumas das notícias são confiáveis. Sugiro atenção ao enunciado.
Já imaginaram se nesta altura do campeonato o governo Jair Bolsonaro ostentasse 5% de ótimo/bom, 17% de regular e 61% de péssimo -- como o jornalismo profissional?
A situação é ainda pior porque a Folha de S. Paulo praticamente escondeu que outros 14% dos entrevistados disseram que as notícias do jornalismo profissional não são nada (nenhuma) confiáveis. Ou seja: entre notícias pouco confiáveis e nada confiáveis temos 75% dos entrevistados.
Vamos agora ao grau de confiança dos entrevistados nas notícias veiculadas nas redes sociais, lembrando que o jornalismo tradicional tem feito campanha maciça para desmoralizar essa nova plataforma de notícias e embates.
Pouca diferença
A situação em termos de confiança nas notícias nas redes sociais não é muito diferente da encontrada no jornalismo profissional: apenas 2% responderam que todas as notícias são confiáveis, 8% disseram que a maioria é confiável e 63% afirmaram que algumas notícias são confiáveis. Só há um descolamento mais acentuado da massa (de 21%) que afirmou que nenhuma notícia das redes sociais é confiável, contra 14% de “nenhum” do jornalismo profissional.
Ou seja: se o candidato chamado jornalismo profissional não teria possibilidade alguma de obter sucesso numa disputa institucional para avaliar quem é quem no Brasil, as redes sociais estariam em degrau inferior. E tanto uma plataforma como a outra dariam um abraço de afogados de baixa credibilidade.
Estou começando a entender porque Jair Bolsonaro bate tanto em determinadas ramais do jornalismo profissional.
Há pelo menos duas vertentes explicativas para esse quadro de horrores em que se meteu o jornalismo profissional. Ou seriam três?
A primeira é que os guerrilheiros das mídias sociais movem ação demolidora contra jornalistas profissionais, sejam independentes, sejam vinculados a partidos políticos e a outras agremiações sociais que os tutelam, quando não os encabrestam ideologicamente.
A segunda vertente é que o jornalismo profissional não passa incólume às turbulências macroeconômicas e microeconômicas de um País que insiste em acreditar que tem todo um futuro pela frente. Além disso, temos uma revolução tecnológica que transformou cada cidadão em autor potencial de seus próprios desejos de manifestação pública.
A terceira vertente é que, por mais que uma massa de deserdados intelectuais não diferencie joio do trigo no jornalismo profissional, nichos importantes da sociedade, invariavelmente com vieses, sabem entender o riscado em que se meteram publicações profissionais que viraram ramais ideológicos que sufocam o pluralismo informativo.
Contexto inquietante
O resumo da ópera é que vivemos contexto muito especial e preocupante nos meios de comunicação tanto tradicionais quanto emergentes em tecnologia.
E não se trata única e exclusivamente de Brasil, mas do mundo como um todo.
A densidade de uso de smartphone será cada vez mais intensificada, em proporção muito superior, ainda, ao grau de civilidade e de compreensão dos fatores que movem o mundo.
Há deslumbramento generalizado nas redes sociais. O espalhamento de sentimentos difusos que não deixam pedra sobre pedra diante de situações de escorregões do jornalismo profissional ou, na maioria dos casos, de posicionamento editorial que contrarie extremistas à direita e à esquerda.
Felizmente não estou mais na ativa do mundo louco de uma redação de jornal ou de revista, roda-viva que triturou meus nervos durante décadas.
Se estivesse ainda na cova dos leões, porque é disso que estamos falando quando se trata de jornalismo profissional coletivo, certamente lembraria dos tempos idos como refresco.
Afinal, tanto a pressão externa se tornou implacável quanto os talentos internos, decorrente da contínua crise das empresas de comunicação, se tornaram raros.
Matando e morrendo
O jornalismo profissional cada vez mais fastfoodiano se confunde com as redes sociais demolidoras. Resultado? Um festival de improdutividades que dão no que estão dando, ou seja, o duplo homicídio no campo da comunicação.
Esperar que a Folha de S. Paulo levantasse a bola do governo Bolsonaro, ou de qualquer outro governo de plantão, admitindo que o jornalismo profissional e as redes sócias têm muito menos prestígio que qualquer autoridade pública, é acreditar em Papai Noel.
Não à toa à Folha fez o possível para camuflar o resultado num canto de página.
O jornalismo profissional ainda não caiu na real e nem se deu conta de que os defeitos que aponta nas redes sociais são praticamente os mesmos que detém, num jogo de espelhos insuportavelmente incômodo.
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21/01/2025 PAULINHO, PAULINHO, ESQUEÇA ESSE LIVRO!