Sociedade

Geração de prata
com peso de ouro

FERNANDO STELLA - 05/10/2002

O vôlei é disparado o segundo esporte mais praticado no Brasil. Perde apenas para o futebol. A conquista do reconhecimento popular no País teve o saque inicial na década de 80, quando equipe comandada dentro da quadras pelo levantador William Carvalho da Silva deixou de lado o anonimato para ocupar as primeiras colocações nas principais competições ao redor do mundo. Demorou, mas o árduo trabalho iniciado no passado rendeu frutos com novos atletas que puseram a mão na medalha de ouro nos Jogos Olímpicos de Barcelona, em 1992, e no título da Liga Mundial em 2001. 

Junto de outros ícones do vôlei como Xandó, Montanaro, Renan e Bernard, William participou da famosa Geração de Prata, que caiu no gosto popular graças ao segundo lugar no Mundial de 1982, na Argentina, e à medalha de prata nos Jogos Olímpicos de Los Angeles, em 1984. Apesar de reconhecer a importância dos atletas para o crescimento do esporte no País, o Capita, apelido que carrega até hoje no meio esportivo, acredita que o então presidente da Confederação Brasileira de Voleibol e atual presidente do Comitê Olímpico Brasileiro, Carlos Arthur Nuzmann, foi peça chave na popularização do esporte. "Passei a temporada de 1980/1981 no vôlei italiano para defender o Catânia. Quando estava em férias, o Nuzmann determinou que nenhum atleta poderia atuar fora do País. Fiquei irritado na época, mas vi que foi excelente para a massificação do vôlei" -- comenta William, eleito Empreendedor Esportivo do Prêmio Desempenho de 2002 e que admira muito o trabalho de Nuzmann, e também ex-jogador de vôlei pelo esporte nacional. "Ele pensa sempre na frente" -- considera. 

Histórias não faltam para marcar os 18 anos de vitórias e derrotas de William com a camisa verde e amarela. Um dos momentos inesquecíveis para o eterno número sete da seleção brasileira foi o desafio internacional contra a ex-União Soviética, no estádio do Maracanã, em 1983, além da participação em quatro Jogos Olímpicos. "Quase 100 mil torcedores assistiram à nossa vitória por três sets a um sobre os soviéticos. Só não levamos mais público porque chovia muito naquele dia" -- lembra.

Nascido em São Paulo em 1954, William tem quase toda a trajetória profissional ligada à extinta equipe da Pirelli, de Santo André. Com exceção de uma temporada no voleibol italiano, foram 13 anos dentro da quadra e dois anos como auxiliar e técnico do time andreense até o término das atividades, em 1993. Nove vezes campeão paulista e quatro como campeão brasileiro são alguns dos títulos conquistados pelo Capita à frente do time que ainda tinha Xandó, Montanaro e Amaury, além de José Carlos Brunoro como técnico.

Com pouco mais de três décadas dedicadas ao vôlei, William conseguiu uma proeza no esporte ao ser ídolo tanto na categoria masculina como na feminina. Hoje comanda as mulheres do Açúcar União/São Caetano, que participam do Campeonato Paulista, mas também passou pelo MRV/Minas, de Belo Horizonte, e pela Uniban, equipe pela qual conquistou o título da Superliga Feminina da temporada 98/99. A evolução como técnico fez William ser lembrado para ocupar o cargo deixado por Bernardinho à frente da seleção brasileira no ano passado. Um dos favoráveis à ida do ex-capitão à seleção é o atual técnico do BCN/Osasco e ex-comandante da seleção masculina, José Roberto Guimarães. "É o desejo de todo técnico. Mas tudo tem o momento exato" -- argumenta.

Definitivamente, William respira vôlei. Além de casado há 21 anos com a ex-jogadora da Pirelli Maria Cecília, acompanha os primeiros passos da filha Stephany Carvalho, de 17 anos. Apesar de iniciar como levantadora, a jovem atua como líbero nas categorias menores do Açúcar União/São Caetano. E não pára por aí. O ex-levantador passa quase sete dias da semana com as meninas do time de São Caetano. "Quando não estamos treinando, jogamos e vice-versa. Sábado e domingo também são dias de trabalho na nossa profissão" -- argumenta. 

Os poucos minutos que tem de descanso entre o treinamento da manhã e o da tarde são dedicados à criação de jogadas e análises dos esquemas táticos dos adversários no computador. "O uso da tecnologia ajuda muito. Precisamos estar sempre atualizados" -- diz o esportista, lembrando que a entrada da tecnologia no esporte é bem mais antiga do que aparenta. "Os Estados Unidos nos derrotaram em 1984 porque analisaram todas as nossas jogadas. Eles conheciam nossas qualidades e defeitos". 

A dedicação ao vôlei trouxe muitas alegrias para William. Um dos orgulhos que o ex-levantador exibe é o reconhecimento fora das quadras. "Vários torcedores já me pararam na rua para falar que escolheram o nome do filho por minha causa. Isso é muito gratificante" -- afirma. Considerado um dos melhores jogadores da história do vôlei mundial, William também é sempre citado pelo atual levantador da seleção masculina Maurício como fonte de inspiração nos momentos mais difíceis. Como Maurício, Capita também teve seu ídolo. O ex-capitão da Pirelli se espelhou em Décio Cattaruzzi, também ex-levantador do Santo André e atual coordenador de esportes do Colégio Singular.

A ascensão profissional da famosa Geração de Prata fora das quadras também é um das alegrias do esportista. Hoje, Bernardinho é técnico da seleção masculina de vôlei, Renan ocupa o cargo de supervisor da Unisul, Montanaro supervisiona o vôlei do Banespa e Bernard está ligado à política, além de Marcus Vinícius e Maurício Jaú atuarem como comentaristas esportivos. "Todos estão bem. Minha frustração é não saber por onde anda o Xandó" -- lamenta William.


Paixão -- A ligação entre Santo André e o ex-capitão vai além das quadras. Desde que deixou a equipe juvenil do Tietê, em 1971, para desembarcar no então Santo André, o ex-levantador nunca mais abandonou o Município. Além de morar e defender por mais de duas décadas a tradicional camisa amarela da Pirelli, exercitou a veia de empresário ao abrir confecção na cidade. Ao lado da mulher Maria Cecília, William comanda duas marcas: a W7, exclusiva para o mundo esportivo, e a Taxímetro, de artigos escolares e camisetas promocionais.

Por pouco Santo André não presencia mudança que poderia alterar a história do esporte nacional. Ídolo de uma geração, William quase trocou o tênis pela chuteira. "O vôlei e o futebol do Santo André estavam ligados. E sempre gostei de jogar futebol, nunca neguei isso. Um dos diretores sabia que eu jogava bem e quis me levar para o time. Só não mudei de esporte porque o José Carlos Brunoro, que era técnico do vôlei na época, não deixou" -- relembra.

O vôlei agradece pela ajuda de Brunoro, mas o futebol jamais deixará de ser uma das paixões do ex-levantador. Apesar da escassez de horário, o técnico ainda encontra tempo para jogar uma peladinha com amigos no campo do Clube Atlético Aramaçan. "Quando posso, sempre estou de chuteiras. Digo que futebol é meu esporte e o vôlei, meu passatempo" -- comenta o torcedor fanático pelo Santos. Frustrado por não poder acompanhar a nova safra de talentos do time da Vila Belmiro por causa dos inúmeros treinos e jogos do Açúcar União/São Caetano, William se consola com os programas esportivos das TVs abertas e por assinatura. "Tenho tantos controles remotos em casa que às vezes nem sei de onde são" -- brinca, admitindo ser telemaníaco. O desejo de assistir à TV aumentou nos últimos meses com a quantidade de competições noturnas e principalmente por causa da insônia. "Cinco horas para dormir já bastam" -- conta.

Além de ver os mundiais de futebol, basquete masculino e feminino, o ex-levantador acompanhou jogo a jogo o Brasil no Campeonato Mundial de Vôlei Feminino, na Alemanha. O time sob comando de Marco Aurélio Motta terminou em sétimo lugar. Os olhos não desgrudaram da telinha também por causa de Marcelle, única atleta do Açúcar União/São Caetano na equipe e que foi considerada a melhor levantadora do Mundial. 


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