De janeiro de 1996 a dezembro do ano passado -- portanto, durante os últimos 96 meses -- os 39 municípios da Região Metropolitana de São Paulo perderam 15% de participação na produção de riqueza industrial do Estado de São Paulo. Com isso, a participação estadual caiu de 51,38% para 44,48%. Parte dessa perda foi amealhada pelos 51 municípios que formam as regiões metropolitanas da Baixada Santista, Campinas, Sorocaba e São José dos Campos. O naco dessas áreas que podem ser chamadas também de Grande São Paulo expandida passou de 22% para 26,83% do Estado. Os demais municípios paulistas -- exatamente 555 localidades -- elevaram levemente a fatia de participação, de 26,22% para 28,69%.
Esses dados são inéditos e fazem parte de investigações que costumeiramente realizo à frente do IEME (Instituto de Estudos Metropolitanos), laboratório de estatísticas e análises que decidi criar para pôr fim à esculhambação generalizada de acadêmicos e pontas-de-lança da iniciativa privada que maltratam os números para atender objetivos nem sempre éticos.
A elasticidade temporal do banco de informações sobre o comportamento do Valor Adicionado no Estado de São Paulo é o melhor antídoto contra malversadores de plantão. Invariavelmente, quando se prenunciam eventuais espasmos de recuperação, não falta quem procure manipular os dados, instrumentalizando-os de forma a contemplar medidas que passam ao largo da nobreza e se ajustam, invariavelmente, como neste ano, ao calendário eleitoral.
Entre os 90 municípios pesquisados pelo IEME, Ribeirão Pires, no Grande ABC, um pedaço de sete municípios incrustados na Região Metropolitana de São Paulo, e Iperó, na microrregião de Sorocaba, aparecem como contrastes. Ribeirão Pires foi quem mais perdeu no período: o Valor Adicionado caiu 57,83% em termos reais (descontada a inflação) nesses 96 meses, enquanto Iperó saltou 336,15%.
Simbolismos importantes
A economia de Ribeirão Pires e a de Iperó representam muito pouco no contexto de cada região e principalmente no conjunto das regiões pesquisadas, mas são simbolicamente explicativas: Ribeirão Pires sofre as dores de um Grande ABC maltratado por série de contratempos estruturais e conjunturais enquanto Iperó representa tendência de absorção de empreendimentos industriais por pequenos e médios municípios próximos dos centros nervosos das respectivas sedes metropolitanas.
Grande parte dos 90 municípios observados pelo Instituto de Estudos Metropolitanos integra o grupo de 75 localidades que compõem os indicadores financeiros, econômicos, sociais e criminais que o laboratório disponibiliza em seu site e que constituem o Índice Geral de Competitividade. Esse estudo paralelo que contempla especificamente cinco regiões metropolitanas é uma vertente de análise do comportamento econômico do Estado de São Paulo. E esses 96 meses quase que integralmente sob o governo de Fernando Henrique Cardoso -- devem ser descontados apenas os primeiros 12 meses do governo Lula da Silva -- mostram que os paulistas estão menos brilhantes na transformação de riqueza industrial.
Faltam dados do Valor Adicionado no contexto nacional para que se estabeleçam confrontos estaduais compatíveis com o mesmo período avaliado internamente em São Paulo, mas mesmo competindo internamente, isto é, consigo mesmos, os paulistas estão deixando a desejar. Em valores atualizados pelo IGPM (Índice Geral de Preços do Mercado), da Fundação Getúlio Vargas, o Estado de São Paulo acumulou em dezembro de 1995 R$ 329,7 bilhões de Valor Adicionado. Noventa e seis meses e 137,69% de inflação depois, chegou a R$ 336,3 bilhões. Um avanço de apenas 2% no período.
O discretíssimo resultado do conjunto do Estado de São Paulo está diretamente relacionado ao esvaziamento industrial da Grande São Paulo. Tanto que os 39 municípios liderados pela Capital caíram 11,69% na transformação industrial no período. O resultado sofreu alta dosagem de contaminação do Grande ABC que, sozinho, perdeu 27,70%. A Grande São Paulo sem o Grande ABC caiu bem menos: 6,44%. As demais regiões metropolitanas alcançaram resultados positivos: a Baixada Santista de 19 municípios cresceu 28,04%, a Grande Campinas de sete municípios avançou 35,29%, a Microrregião de Sorocaba de 15 municípios evoluiu 6,58% e a Microrregião de São José dos Campos de oito municípios aumentou a musculatura industrial em 10,01%. Desse coquetel de números positivos, e do desconto da perda acentuadíssima do Grande ABC e mais comedida dos demais municípios da Grande São Paulo, resultou o ganho líquido de 2% -- sempre em termos reais, descontada a inflação.
Para saber o quanto a Grande São Paulo perdeu de riqueza industrial em valores atualizados a dezembro do ano passado e a partir de janeiro de 1996 a conta é simples: se a participação do conjunto de 39 municípios em dezembro de 1995 era de 51,38% e caiu, 96 meses depois, para 44,48%, a diferença de 6,90 pontos percentuais significa R$ 23 bilhões. Traduzindo: cada ponto percentual da riqueza industrial paulista em dezembro do ano passado correspondia a R$ 3,363 bilhões. Basta multiplicar esse valor por 6,90 pontos percentuais e o desastre está consumado. O Grande ABC somou R$ 30,2 bilhões de Valor Adicionado do total de R$ 149,6 bilhões da Região Metropolitana de São Paulo. Um naco de 20%, contra 24,7% de dezembro de 1995 -- ou 23% de perda na RMSP.
Como os próprios números escancaram, a hegemonia da Grande São Paulo na indústria de transformação do Estado foi para o ralo nesses 96 meses. De 51,38% caiu para 44,48%. Em sentido contrário, as demais regiões metropolitanas paulistas que estão num raio de até 150 quilômetros da Capital elevaram a participação relativa de 22% para 26,83%. É praticamente impossível reverter essa situação.
A perspectiva de interiorização industrial está simetricamente combinada com referenciais de competitividade. Incentivos locacionais, reduções tributárias, logística integrada e qualidade de vida são pesos preponderantes na definição de investimentos produtivos. Os grandes municípios industrializados, inclusive Campinas, Sorocaba e São José dos Campos, sofrem com o assédio da vizinhança de menor porte.
O grande salto da Região Metropolitana de Campinas, que cresceu 35,29% na produção industrial nos 96 meses analisados, reflete a confluência de uma série de vetores que o Grande ABC, que desceu a ladeira de queda de 27,70% no mesmo período, não consegue sustentar. A balança industrial era francamente favorável ao Grande ABC antes da consolidação da descentralização do setor automotivo. Em dezembro de 1995 os sete municípios acumulavam R$ 41,8 bilhões em Valor Adicionado, contra R$ 32,1 bilhões da Grande Campinas -- uma diferença de 25% em favor do Grande ABC. Noventa e seis meses depois, a Grande Campinas elevou para R$ 43,4 bilhões a produção industrial, contra R$ 30,3 bilhões do Grande ABC. Agora, a Grande Campinas está 30,1% à frente do Grande ABC.
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