Não há nada mais contraproducente e politicamente incorreto para quem precisa deixar o Grande ABC do que fazer alarde sobre a arrumação das malas. Sair de fininho, como um bicão de festa, é a melhor estratégia. O conselho é especificamente para o setor industrial. Quem seguir a regra e sair de manso, como tantas empresas fizeram, não terá problemas. Dirigentes sindicais, principalmente dos metalúrgicos, vão fazer de conta que não é com eles. Administradores públicos também virarão as costas, para não mexer em assunto tão abrasivo.
Agora, quem tiver a péssima idéia de abandonar o barco regional com certo estardalhaço, que se prepare porque mexe com os brios sindicais e políticos. A Multibrás está passando por isso em São Bernardo. E a Toyota foge disso, também em São Bernardo. A decisão de dar à Multibrás sobrevida até fevereiro do ano que vem foi comemorada com a estupidez de quem enxerga uma árvore e não a floresta. A medida anunciada no início deste mês pelo comitê executivo da Whirlpool Corporation, em reunião realizada em Miami (Estados Unidos), é uma forma de a multinacional que tem o controle da fabricante das marcas Brastemp e Consul mostrar que reserva alguma sensibilidade social no mundo globalizado. O secretário de Desenvolvimento Econômico e Turismo de São Bernardo, José Humberto Celestino Macedo, e o presidente do Sindicato dos Metalúrgicos do ABC, Luiz Marinho, viajaram para os Estados Unidos juntamente com a cúpula da Multibrás no Brasil. O resultado final, que adia de 31 de julho para fevereiro de 2002 o fechamento da unidade em São Bernardo, transfere 1.050 demissões e estimula promessas de recolocação do operariado no mercado de trabalho.
Fosse véspera de eleição, a decisão certamente frequentaria os palanques tanto da situação quanto da oposição política em São Bernardo, que podem ser resumidas entre os sindicalistas que apoiam Vicentinho Paulo da Silva e o Poder Público do prefeito Maurício Soares em busca de sucessor. De forma prática, sem manipulação, o fato é que a Multibrás deixou São Bernardo de fininho o quanto pôde, durante anos a fio, já que chegou a ter 15 mil trabalhadores numa área hoje ocupada em grande parte pelo Wal-Mart. Problemas de vários matizes, entre os quais uma excessiva carga sindical que colocou a empresa no mesmo saco sem fundo de reivindicações atendidas pelas montadoras de veículos, inviabilizaram a manutenção da empresa em São Bernardo. A extrema unção para 1.050 empregos é apenas a pá de cal de um processo histórico de esvaziamento.
Já a fábrica da Toyota está sendo preparada para deixar São Bernardo até o final deste semestre, quando será interrompida a produção do utilitário Bandeirantes. O veículo é fabricado na região há quatro décadas e está condenado tecnologicamente. Da linha de produção saem apenas três mil unidades por ano, um contra-senso num mundo automotivo onde escala de produção faz a diferença entre sucesso e fracasso.
Há muito tempo se especula sobre a saída da Toyota, mas desta vez foi o próprio presidente da companhia, Hioroyuki Okabe, quem confirmou a informação para o jornal Valor de 16 de fevereiro, durante festa de confraternização da empresa com a Imprensa. A informação de que a Toyota trataria com o Sindicato dos Metalúrgicos do ABC dos quase 700 empregados da fábrica não é confirmada pelo sindicato nem pela Assessoria de Imprensa da montadora. O efeito-Multibrás aterroriza tanto a empresa quanto os sindicalistas. Mas o fato é que a Toyota de São Bernardo vai se limitar a produzir peças para o Corolla, cuja linha de montagem foi aberta há dois anos em Indaiatuba, Interior de São Paulo. O problema é que a medida é logisticamente pouco sensata e serviria apenas para reduzir temporariamente o impacto de puro e simples fechamento da fábrica da região.
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12/02/2025 DESEMPREGÔMETRO ABALA SÃO CAETANO